15 de outubro de 2012
ÁRVORE DA VIDA - Um Estudo Sobre Magia XI
Segunda Parte
"SENTADO EM SUA CADEIRA VOCÊ PODE VIAJAR MAIS DO QUE COLOMBO JAMAIS O FEZ E PARA MUNDOS MAIS NOBRES DO QUE AQUELES QUE OS OLHOS DELE CONTEMPLARAM."
CAPITULO VII
O propósito e a função da magia devem agora estar absolutamente claros. Trata-se de uma ciência espiritual. É um sistema técnico de treinamento que tem um objetivo mais divino do que mundano e terrestre. Se alguns observadores casuais pensam que o teurgo se ocupa exclusivamente de coisas objetivas, isso ocorre apenas porque é através delas e dos nôumenos que simbolizam que ele é capaz de alcançar seus fins.
O equipamento utilizado pelo mago não é o único recurso empregado por ele e nem o único instrumento para os seus fins, embora o aspecto invisível de suas operações não pudesse jamais ser compreendido pelo profano sem elucidação.
Todas as coisas, físicas e mentais, tinham necessariamente que entrar em seu trabalho, e não foi com a finalidade de ludibriar seja a si mesmo seja aos seus adeptos que o mago se cercou com o que pode ser considerado um “aparato de palco” extremamente impressionante de bastões, taças, incensos, perfumes, sinais e símbolos estranhos, sinos e sonoras invocações bárbaras.
Foi se referindo aos símbolos e sigillae que Jâmblico escreveu que “...eles (teurgos), imitando a natureza do universo e a energia produtiva dos deuses, exibem certas imagens mediante símbolos de intelecções místicas, ocultas e invisíveis, tal como a natureza... expressa razões invisíveis através de formas invisíveis. ...Consequentemente, os egípcios, percebendo que todas as naturezas superiores se regozijam com a imitação dos seres inferiores em relação a eles, e assim desejando acumular de bem os seres inferiores através da maior imitação possível das naturezas superiores, muito apropriadamente demonstram um tipo de teologização adaptado à doutrina mística ocultada nos símbolos”.
Isso, entretanto, não consegue de modo algum responder adequada e satisfatoriamente à pergunta ordinária, a saber, por que o mago é equipado de tais “adereços” como o manto, o sino e o círculo, todos eles inteiramente incompreensíveis para o indivíduo médio, um tanto inconsistentes e com grande ressaibo de charlatanismo?
Esse parecer é, claro está, completamente incorreto. Com efeito, seria tão errôneo e tão injustificável quanto acusar um físico de charlatanice porque em seu laboratório possui diversos microscópios de diferentes capacidades, providos de mecanismos, tubos e lâminas, e porque tem sobre sua escrivaninha um monte de papéis contendo fórmulas físicas e matemáticas incompreensíveis. Estes são apenas meios pelos quais o físico passa a compreender germes, bacilos, organismos microscópicos e assim por diante no estudo do qual se ocupou.
Os instrumentos mágicos são, do mesmo modo, os meios – igualmente incompreensíveis para o leigo – pelos quais o mago se capacita a compreender a si mesmo e comungar com as partes invisíveis da natureza, nem por isso menos reais. Já definimos a magia como a ciência que tem como objetivo próprio o treinamento e fortalecimento da vontade e da imaginação. Mais do que qualquer outra coisa, é o pensamento e vontade o que realmente conta na magia, e a hipótese mágica é que seja pelo uso dos instrumentos da arte e os sigillae com os quais o teurgo se cerca em seu trabalho cerimonial que essa ampliação das faculdades criativas é obtida.
Éliphas Lévi é muito preciso quanto a esse ponto e observa que “...cerimônias, vestes, perfumes, caracteres e figuras sendo necessários como dissemos para empregar a imaginação na educação da vontade, o sucesso das operações mágicas depende da fiel observância de todo rito”. E também, poder-se-ia acrescentar, da presença e uso preciso de todos os sigillae corretos.
Hieráticos, sugestivos e bastante impressivos, o importante acerca desses instrumentos e vestes, sinais e símbolos, é que se trata de símbolos que representam ou uma força oculta inerente ao homem, ou uma essência ou princípio que se obtém como uma força móvel inteligente no universo. Sua intenção primária é promover uma corrente automática de pensamento harmonioso ou um ímpeto irresistível na imaginação que exaltarão o ser do mago na direção disposta pelo caráter da cerimônia e pela natureza individual dos símbolos.
Em síntese, o ritual mágico é um processo mnemônico arranjado de modo a resultar no deliberado regozijo da vontade e na exaltação da imaginação, sendo sua finalidade a purificação da personalidade e o atingimento de um estado espiritual de consciência no qual o ego se une ou com seu próprio eu superior ou com um deus. Esse objetivo único de qualquer cerimônia particular é constantemente indicado por cada ato, palavra e pensamento. Mesmo os sigillae são diferentes para cada cerimônia de sorte a indicar seu propósito único, e um tipo de símbolo é aplicável somente à invocação de uma espécie de essência universal. “Não há nada...”, acreditava Jâmblico “que no mais ínfimo grau esteja adaptado aos deuses para o qual os deuses não estejam imediatamente presentes e com o que não estejam conjugados.”
Para o assalto da Cidade Santa todo sentido e toda faculdade são deliberadamente mobilizados e toda a alma individual do operador tem de tomar parte na ação. Cada uma das várias fumigações, cada mínimo detalhe do banimento, invocação e circumpercurso é, de fato, para servir de lembrete do propósito único que exclusivamente existe para o mago, um meio tanto de concentração de seus poderes como de exaltação.
Quando símbolo após símbolo afetaram sua consciência, quando emoção após emoção foram despertadas para estimular a imaginação do mago, então advém o supremo momento orgiástico. Todo nervo do corpo, todo canal de força da mente e da alma são estirados num avassalador espasmo de felicidade, um transbordamento estático da vontade e a totalidade do ser na direção predeterminada.
Toda impressão, por meio do método cabalístico de associação de idéias, é tornada o ponto de partida de uma série de pensamentos conectados resultando na suprema idéia da invocação. Quando, durante uma cerimônia, o teurgo permanece no interior de um octágono, os nomes em torno do círculo, as oito velas ardendo vivamente fora, a predominância da cor laranja, a elevação do incenso estoraque numa coluna delgada de névoa a partir do incensório, tudo sugerirá o significado de Mercúrio e Hermes à sua mente. O misticismo de ordinário considera os sentidos como barreiras à luz da alma e que a presença da luz tem sua manifestação impedida devido à influência sedutora e à turbulência dos sentidos e da mente.
Na magia, contudo, considera-se que os sentidos, quando controlados, são os portais dourados através dos quais o Rei da Glória pode entrar. Na operação invocatória, todo sentido e toda faculdade têm que participar. “O entendimento precisa ser formulado por sinais e resumido por caracteres ou pentáculos.
A vontade tem que ser determinada por palavras e estas por atos. A idéia mágica tem que ser traduzida em luz para os olhos, harmonia para os ouvidos, perfumes para o olfato, sabores para a boca e formas para o tato.” Essa citação de Éliphas Lévi exprime adequadamente de que maneira o homem integral tem que participar dos ritos teúrgicos. Visto que o ritualista egípcio proferia que não há nenhuma parte dele que não seja dos deuses, a utilização dos sentidos e poderes da mente num ritual bem ordenado constitui o método ideal de invocação dos deuses.
Toda parte individual do homem, cada sentido e poder precisam ser trazidos à esfera do rito em que tomam parte. É nossa preocupação, normalmente, com as perpétuas exigências independentes do corpo, da mente e das emoções que nos cegam para a presença desse princípio interior, a única realidade da vida interior. Daí um dos requisitos do ritual ser ele ou ocupar plenamente ou tranqüilizar essas porções particulares do ser de alguém, de sorte que a união transcendental com o daimon não sofra interferência. O sistema elaborado de formas de divindade, vibração de nomes divinos, gestos e sinais, assinaturas de espíritos, a preeminência de símbolos geométricos e perfumes penetrantes, além de seu propósito ostensivo de invocar a idéia desejada à manifestação, fornecem esse motivo auxiliar.
Ocupar plenamente a atenção de cada um dos princípios inferiores ou vivificá-los é uma das funções do ritual, deixando a alma livre para ser exaltada e fazer seu caminho voando até o fogo celestial, onde finalmente é consumida por completo para renascer em felicidade e espiritualidade. Num certo sentido, o efeito do ritual e da cerimônia é manter os sentidos e veículos comprometidos cada um com sua tarefa específica, sem distrair a concentração superior do mago. E, ademais, ele os separa ao atribuir uma tarefa definida a cada um.
Assim, quando o momento da exaltação chega, quando o casamento místico é consumado, o ego é despido, despojado inteiramente de todos os seus invólucros, deixado livre para virar-se para a direção que lhe aprouver. Ao mesmo tempo, a mais importante função da cerimônia é realizada, tendo sido promovida no coração do operador uma intoxicação tão intensa a ponto de servir como o ponto preliminar para o êxtase da união com o deus ou anjo.
De um outro ponto de vista, o efeito do ritual e do aparato é criar de maneira plena na imaginação do mago através dos canais dos sentidos uma idéia que – em virtude de sua realidade, iluminação e poder supremos quando evocada – tenha sido chamada de deus ou espírito. Essa é a posição subjetiva que, por antecipação, foi esboçada numa página anterior. “Todos os espíritos e, por assim dizer, as essências de todas as coisas, jazem ocultos em nós e nascem e são gerados somente pela atuação, poder (vontade) e fantasia* (imaginação) do microcosmo.”
Barrett, nessa sentença citada, argumenta que se pode razoavelmente supor que os deuses e as hierarquias de espíritos sejam simplesmente facetas previamente desconhecidas de nossa própria consciência. A sua evocação ou invocação pelo mago não são certamente incomparáveis a um estímulo de alguma parte da mente ou imaginação, resultando em êxtase, inspiração e expansão da consciência.
A observação e experiência de teurgos, levadas a cabo num longo período de tempo, mostraram mais ou menos que entre certas palavras, números, gestos, perfumes e formatos que em si não são particularmente significativos, ocorre uma relação natural peculiar. A imaginação é um agente criador poderoso, e quando estimulada de várias maneiras suas criações assumem uma aparência da mais elevada realidade.
Qualquer idéia ou pensamento rudimentar ou latente na imaginação – ou como os teurgos preferem, espírito – pode ser convocada ou criada dentro da consciência individual pelo uso e combinação daquelas coisas que lhe são harmoniosas, expressando fases particulares de sua natureza ou simpatias com sua natureza. Pouco importa se para descrevê-lo empreguemos os arcaísmos dos filósofos medievais, a linguagem de laboratório do psicanalista ou o mundo de sonho e fantasia do poeta. Podemos chamá-lo de liberação do inconsciente, de restauração do crepúsculo da memória da raça, ou podemos ousar ser suficientemente corajosos para usar a retumbante palavra antiquada “invocação” ou inspiração.
As palavras não são nada, o fato é tudo. Tal como as letras “c, ã, o”, que em si mesmas e isoladas umas das outras carecem de qualquer importância em particular, quando combinadas exprimem a idéia de cão, do mesmo modo palavras mágicas, incensos, pentáculos e o estímulo da vontade podem produzir dentro da imaginação uma idéia de grande poder. Na verdade, tão poderosa essa criação pode se revelar que é possível que confira inspiração, iluminação e reaja para grande proveito para a mente humana.
* fantasia, imaginação em grego.
Quero agora considerar os vários acessórios usados. Perfumes e incensos sempre foram utilizados nos ritos mágicos e os antigos taumaturgos fizeram um estudo especial da reação física e moral causada pelos distintos odores. Seu emprego no cerimonial tem tripla finalidade.
Em algumas operações por vezes é necessário suprir um veículo ou base materiais ao espírito que se manifesta. Quantidades dos incensos apropriados são queimadas, de modo que a partir das densas partículas que flutuam como uma pesada nuvem esfumaçada na atmosfera uma base ou corpo físicos possam ser construídos pelo espírito evocado para serem usados como veículo temporário. Ademais, perfumes são oferecidos como oferendas aromáticas ou sacrifício ao próprio espírito ou anjo, variando o incenso em função de cada classe de inteligência. Benjoim e sândalo são empregados para espíritos venusianos, flor de noz-moscada e estoraque para os mercurianos, enxofre para os saturnianos, gálbano e canela para as forças solares, e assim por diante.
Em terceiro lugar, há o bastante importante efeito intoxicante dos incensos potentes e penetrantes na própria consciência, um incenso em separado sendo indicado para acompanhar a invocação de cada divindade.
Existe ainda uma outra interpretação do uso dos incensos. Cada letra do alfabeto hebraico lhe atribuiu um grande número de correspondências, envolvendo espíritos, inteligências, cores, gemas, idéias e os próprios incensos. Tomando-se as letras no nome de um espírito e consultando-se as autoridades adequadas, um composto de incensos poderá ser confeccionado, o qual exprimirá através do sentido do olfato o nome do espírito. Tão-somente a partir desse composto de perfumes poderá o espírito apropriado ser sugerido na imaginação e convocado pelos ritos adequados.
Resta pouca dúvida a respeito da sugestão essencial desses perfumes, visto que mesmo para indivíduos comuns alguns incensos são decididamente sedutores e excitantes, como é o caso do almíscar e do patchuli, havendo ainda outros sobremaneira fragrantes e generosos, e outros que possuem efeito sedativo e tranqüilizante.
Quanto ao som, seu poder formativo é mais ou menos bem conhecido e será abordado um pouco mais detalhadamente numa página posterior em conexão com os chamados “nomes bárbaros de evocação”. De momento basta dizer que o som está vinculado à lei da vibração, cujas forças são suficientemente poderosas para desintegrar ou construir novamente qualquer forma para a qual se dirija a vibração.
O egiptólogo Sir E. A. Wallis Budge observou que os sacerdotes egípcios conferiam a maior importância às palavras pronunciadas sob certas condições. Na verdade, toda a eficácia das invocações teúrgicas parece ter dependido da maneira e do tom de voz nos quais as palavras eram proferidas. Invocação, diz Jâmblico, “é a chave divina que abre aos homens o santuário dos deuses; nos acostuma aos rios esplêndidos de luz superior; e num curto período os dispõe ao abraço e contato inefáveis dos deuses; e não desiste até que nos erga ao topo de tudo".
O sacramento do sentido do paladar constitui um problema mais complexo. Sua base racional como eucaristia corresponde simplesmente a isso. Uma substância é cerimonialmente consagrada e nomeada segundo um princípio espiritual que mantém com ela uma especial afinidade. Uma hóstia de trigo teria estreita afinidade com Ceres ou Perséfone; o vinho com Baco e Dionísio. Algumas substâncias se harmonizarão mais com inteligências jupiterianas ou mercurianas do que outras.
O estudo do alfabeto mágico capacitará o aprendiza certificar-se do que deve ser usado. Assim nomeada, a substância é carregada mediante a invocação daquela presença divina, e sendo consumida se prevê que através da assimilação dos elementos o deus ou a essência divina invocada invariavelmente encarna no ser do mago por meio da substância consagrada. Esta encarnação é uma outra forma da união do teurgo com o deus, união que segundo a definição das autoridades antigas é um dos aspectos mais importantes da magia. Essa espécie particular de união, se continuada por um certo período de tempo, auxilia a comunhão com as essências divinas, à medida que os veículos se tornam mais refinado e mais altamente sensíveis à presença do deus.
No que concerne ao sentido da visão, será necessário abordar mais minuciosamente os diferentes símbolos usados. Alguns desses símbolos são, naturalmente, comuns a toda cerimônia, enquanto que outros dizem respeito estritamente a uma cerimônia particular. Por exemplo, a espada é uma arma marcial à qual se atribui um papel numa operação devotada à invocação de Hórus e Marte.
Numa cerimônia preparada, digamos, para a invocação de Afrodite ou Ísis, a espada nada teria com comum e estaria em total desarmonia com a natureza dessas deusas, de modo que todo o procedimento daria em nada. Um acessório como a rosa, que expressa amor e a declaração da natureza de ser como graça a filha de Deus, seria sumamente apropriado numa cerimônia em que o teurgo deseja desenvolver suas emoções mais elevadas. Mas na operação para invocar a Senhora Maat, a rainha da verdade, a rosa não teria lugar algum.
O principal símbolo comum a toda operação é o círculo mágico. Por definição, essa figura encerra um espaço confinante, uma limitação, separando aquilo que está dentro daquilo que está fora. Pelo uso do círculo, o mago afirma que no interior dessa limitação auto-imposta ele confina seus esforços; que ele se limita à consecução de um fim específico e que não está mais num labirinto de ilusão e mudança perpétua como um viandante cego sem meta, objetivo ou aspiração. O círculo, além de ser, como é evidente, o símbolo do infinito, tipifica também a esfera astral do mago que, num certo sentido, é a consciência individual, seu universo, fora do qual nada pode existir.
Nesse sentido, a título de recurso de explicação, a teoria do idealismo subjetivo se mostra novamente conveniente. O círculo no qual o mago está encerrado representa seu cosmos particular; a conquista auto-inaugurada desse universo faz parte do processo de consecução de completa autoconsciência. Já que o cosmos é uma criação do ego transcendental, à medida que um mago amplia o alcance de seu universo, familiarizando-se com sua estrutura e diversidade, muito mais se aproximará ele da auto-realização. De um outro ponto de vista, o círculo pode ser considerado o Ain-Sof e o ponto central do círculo o eu, cuja função é expandir a si mesmo para incluir a circunferência e se tornar, também, o infinito.
Em torno desse círculo são inscritos nomes divinos. Muitos deles serão diferentes em função da natureza de cada cerimônia e é com o poder e influência ingênitos inerentes aos nomes que o mago conta como uma proteção contra os viciosos demônios externos – os pensamentos hostis de seu próprio ego. A menção dos nomes de guarda em torno do círculo levanta a questão do processo de proteção do círculo astral interno, o universo da consciência, e como uma proteção adequada para a esfera astral bem como para o círculo externo pode ser obtida. N
ão basta para o mago que pinte os nomes divinos na circunferência do círculo sobre o chão de seu templo; isto não passa de uma parte do processo efetivo e um signo visível externo de uma graça espiritual interior. Para que se produza um círculo astral que será tão inexpugnável quanto uma fortaleza de aço da qual o círculo pintado será um digno símbolo, banimentos deverão ser executados durante meses várias vezes por dia. A consagração e invocação implícitas no ritual de banimento devem ser insistentemente realizadas dias após dia, e uma sutil substância espiritual proveniente de planos mais elevados infundida na esfera astral, tornando-a elástica e rutilante com coruscações de luz. Essa aura agudamente resplandecente constitui o círculo mágico real do qual o círculo visível no chão do templo é apenas um símbolo terreno.
Não seria inoportuno tecer mais algumas observações sobre o círculo mágico com o fito de esclarecer a posição real da magia contra o opróbrio lançado por William Q. Judge – um dos fundadores da Sociedade Teosófica com Madame Blavatsky em 1875 – em suas Notas acerca do Bhagavad Gita.
William Q. Judge acalenta a ilusão nesse trabalho, como o fazem tantos outros escritores alhures, de que todas as operações mágicas são exclusivamente devotadas à evocação de elementais. Que essa é uma hipótese errônea me esforçarei neste livro para mostrar. Não é em absoluto incogitável, entretanto, que Judge tenha dado essa interpretação com a finalidade de conter os irmãos mais fracos, afastá-los do perigo e da intromissão em coisas que estão além deles.
Judge exprime a crença de que o uso do círculo como um dispositivo de proteção para impedir o ingresso de demônios e outras entidades astrais se deve ao medo deles, e ele conclui acertadamente que o medo é o produto da ignorância, que muito corretamente ele deplora. Teoricamente, essas observações são todas excelentes e plausíveis. A ignorância dá origem, de fato, ao medo e se encontra na raiz do fracasso e de uma larga quantidade de problemas. Na vida do dia-a-dia, contudo, censuramos e proibimos o uso da profilaxia cirúrgica e dos dispositivos de desinfecção alegando como razão que eles têm suas raízes no medo da infecção? Devem as calçadas e os passeios serem abolidos e eliminados de nossas ruas porque são eloqüentes lembretes e expressões de nosso pavor com relação aos acidentes automobilísticos?
Na realidade, todo o argumento nesse sentido é um absurdo. Num caso ou noutro, ele encerra uma total falta de compreensão da natureza, propósito e função do círculo. Quando se prevê o perigo a partir de qualquer fonte, naturalmente tomam-se medidas que se acha que o evitarão, estando além da questão todas as idéias de medo e ignorância, o que constitui a razão da existência da humanidade sobre a Terra atualmente.
Se, por exemplo, estou envolvido numa cerimônia que tem por objeto a invocação de meu Santo Anjo Guardião, deverei eu permanecer satisfeito por ter minha mente, minha alma e a esfera de operação em geral invadida por uma hoste de entidades abjetas, os mais baixos habitantes do plano astral que, sem dúvida, seriam atraídos pelas influências magnéticas que emanam de meu círculo? Agir assim arruinaria todos os meus esforços, condenando de antemão a operação, se executada cerimonialmente, a um fracasso sinistro. E como se não bastasse, a obsessão poderia ser o resultado, estando-se muito distante do propósito original do trabalho.
A função do círculo é simplesmente estabelecer um limite espacial dentro do qual o trabalho espiritual possa proceder sem interferências e sem o medo da intrusão de forças demoníacas e estranhas. De qualquer modo, ingressar numa carreira de mago com medo covarde no coração é simplesmente atrair problemas. E há geralmente problemas suficientes ao longo de nossa vida normal sem que tenhamos que assumir o heroísmo de pedir mais.
Indicando a natureza do trabalho, dentro do círculo é geralmente inscrita uma outra figura geométrica, como um quadrado, um octágono, uma cruz-tao ou um triângulo. Um figura de cinco pontas denotará uma operação marcial e representa o império da vontade sobre os elementos. Um octágono indicará trabalho cerimonial de uma natureza mercuriana, já que o oito é o número de Hod, a Sephira à qual Mercúrio é atribuído.
Erigido no interior dessa figura, como o fundamento de todo o trabalho do mago, o símbolo da vontade inferior, está o altar sobre o qual estão arrumados os instrumentos mágicos a serem empregados. É o centro fundamental do trabalho do mago, o pivô ao qual ele retorna repetidamente depois do circumpercurso.
Esse altar deve ser construído de tal maneira que sua forma e tamanho e os próprios materiais de que é construído estejam todos de acordo com os princípios fundamentais da Cabala, servindo assim para lembrar o mago do trabalho em pauta. O cedro, por exemplo, se empregado na construção do altar, produziria uma associação imaginativa com Júpiter, enquanto que o carvalho é uma atribuição de Marte. A madeira do loureiro ou a acácia, ambas atribuídas a Tiphareth, se harmonizariam, entretanto, com qualquer tipo de operação na medida em que Tipharethe suas correspondências simbolizam harmonia e equilíbrio.
Este altar deve ser feito de tal maneira que possa atuar como um armário no interior do qual todos os instrumentos possam ser conservados e guardados com segurança. Relativamente a esta regra geral, há, contudo, uma exceção. A lâmpada tem sempre que estar suspensa sobre a cabeça do teurgo, não devendo jamais ser mantida dentro do armário do altar. Em todo sistema ela simboliza o brilho não ofuscado do Eu superior, o Santo Anjo Guardião a cujo conhecimento e conversação o teurgo aspira tão ardentemente. Sempre que essa lâmpada estiver brilhando, iluminando o trabalho mágico, a operação manterá o selo imortal da legitimidade e a permanente sanção e aprovação, por assim dizer, do Espírito Santo. Ademais, o azeite consumido por essa lâmpada é azeite de oliva, sagrado a Minerva, a deusa da sabedoria.
Essas armas, as chamadas armas elementares, são arrumadas no topo do altar antes da operação. Consistem do bastão, da espada ou adaga, da taça e do pantáculo, representando as letras do Tetragrammaton e os quatro elementos dos quais toda a gama de heterogeneidade do cosmos foi constituída.
O bastão é atribuído ao elemento fogo; a taça à água, enquanto que a espada é atribuída ao ar, o pantáculo simbolizando a fixidez e a inércia da terra. Não há arma para representação do quinto elemento de coroamento, que é o Espírito ou Akasha, pois esse é invisível e sua cor tátvica é negro ou índigo.
(Continua)
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