27 de maio de 2012

ÁRVORE DA VIDA - Um Estudo sobre Magia III


CAPITULO III
Insistem todos os teurgos do passado que a augusta filosofia que serve de base à teoria e técnica da magia, sendo tão importante quanto o trabalho prático e uma necessidade radical que deve preceder esse trabalho, constitui um pré-requisito para qualquer discussão adicional. Na verdade, dificilmente teremos um efetivo entendimento da base racional da magia e certamente nenhuma compreensão das complexidades que ocorrem no interior e no exterior da constituição do mago se o fundamento filosófico não estiver firmemente assentado em sua mente. Se há perigo na busca da magia, esse perigo só surge quando o operador não dispõe de conhecimento preciso do que está fazendo.

É de uma compreensão inteligente do significado dos símbolos do oculto e das realidades que eles, em primeiro lugar, visam a comunicar que a eficácia dos ritos depende muito. Os símbolos e acessórios da magia nas mãos profanas de alguém não familiarizado com os fundamentos da arte indubitavelmente não produziriam os corretos efeitos taumatúrgicos. Contudo, o mero conhecimento intelectual desses princípios arcanos é de pouca valia se não houver experiência espiritual. Em contrapartida, a investigação mágica do universo e sua conseqüente compreensão espiritual na consciência assumem maior dignidade, e implicação e profundidade mais férteis se apoiadas numa compreensão teórica.

Em sua recente obra, Os mistérios do Egito, Lewis Spence afirmou que o sistema filosófico da magia reuniu “e tornou manifestos toda a sabedoria e conhecimento arcano do mundo antigo, que foram assim cristalizados e sistematizados de tal maneira que tivessem sido eles preservados de uma forma não adulterada, teriam certamente poupado épocas posteriores de muitas catástrofes religiosas e muito falso misticismo. Mas graças à indolência e negligência de seus preservadores e talvez através das cínicas influências que lhes eram impingidas de fora, sua primitiva beleza divina foi gradualmente perdida até, finalmente, restar apenas o esqueleto de seus rituais e cerimônias”.

Foi nas religiões esotéricas ortodoxas que alguns dos vários fragmentos esparsos do esqueleto mágico foram retidos, em sua maior parte ineficazes e incompreensíveis para a maioria devido à inescrupulosa adulteração. Mas a essência da magia, sua “primitiva beleza divina”, foi preservada por mãos altruístas e cuidada zelosamente em mentes sublimes, e se houver muita aplicação, pode até ser compilada em publicações.

Nos trabalhos gnósticos, inclusive nos escritos neoplatônicos, nas propositais obscuridades dos alquimistas, em meio à literatura procedente dos rosacruzes – em tudo isso temos a possibilidade de encontrar vestígios luminosos da filosofia e prática dessa magia da luz que, cuidadosamente reunidos sobre a base sintética suprida pela Árvore da Vida, formam um sistema sublime e funcional que concede a luz da compreensão a todos aqueles que queiram contemplá-la.

Os principais ingredientes do sistema mágico são a Árvore da Vida qabalística, que é a fonte de referência, e a religião hierática da casta sacerdotal do Egito. Existe, devo mencionar – deixando a interpretação a critério do leitor – a lenda segundo a qual a Qabalah foi recebida por Moisés como uma custódia sagrada no Sinai, que ele a entregou a Josué, o qual a entregou, por sua vez, aos juízes, e estes ao sinédrio, até que finalmente os Tanaim e rabinos posteriores se apoderaram dela e a trabalharam. Outras pessoas sustentam com convicção que se essa pessoa chamada Moisés existiu historicamente e se a Qabalah e seus corolários se originaram dele, ele a obteve dos sacerdotes egípcios, em companhia dos quais ele sem dúvida estudou nos templos do Nilo.

Poucos países no mundo, exceto a Índia, talvez, podem se gabar de uma crônica de tradição mística e mágica tão eloqüente quanto o Egito, que com justiça recebeu o título de matriz da magia. Se a Qabalah é ou não realmente oriunda dos egípcios ou qualquer outro povo é um ponto discutível, não havendo, apesar da lenda e da especulação extravagante, nenhuma evidência histórica autêntica nesse sentido. E contudo, a teurgia prática dos egípcios se harmoniza notavelmente bem com as teorias filosóficas da Qabalah, e a experiência de uma multidão de magos tende a nos fazer crer que dificilmente poderia haver uma combinação mais adequada ou mais satisfatória.

Conseqüentemente, apresentaremos aqui uma exposição dos princípios subjacentes do universo tais como concebidos pelos magos e um estudo daquilo que forma necessariamente a base de todo o trabalho prático. Essa concepção do universo será resumidamente enunciada nos termos filosóficos da Qabalah, e entremeada em torno da estrutura central da Árvore da Vida. “Quem penetra no santuário da cabala é tomado de admiração à vista de um dogma tão lógico, tão simples e ao mesmo tempo tão absoluto. A união necessária das idéias e dos signos, a consagração das realidades mais fundamentais pelos caracteres primitivos, a trindade das palavras, letras e números; uma filosofia singela como o alfabeto, profunda e infinita como o Verbo; teoremas mais completos e luminosos que os de Pitágoras; uma teologia que se condensa contando pelos dedos; um infinito que pode caber na palma da mão de uma criança; dez algarismos e vinte e duas letras, um triângulo, um quadrado e um círculo: aqui está a totalidade dos elementos da cabala. São os princípios básicos do Verbo escrito, reflexo desse Verbo discursante que criou o mundo!” – Assim pensava Lévi, e na verdade é preciso concordar sinceramente com ele, pois o admirável fundamento da Qabalah é uma simples estrutura matemática de símbolos, números e nomes, que emprega dez números e as letras do alfabeto dos anjos, como foi denominado o alfabeto hebraico.

A matemática sempre foi considerada uma ciência divina pelos discípulos da filosofia esotérica, particularmente entre os pitagóricos, prefigurando, como o faz por meio do número os processos criativos tanto do universo quanto do desenvolvimento do ser humano. Diversos magos sustentaram que foi pelas idéias expressas no número que a natureza foi concebida no seio do espaço infinito. Dessas idéias universais brotaram os elementos primordiais, os imensos ciclos do tempo, os corpos cósmicos e toda a gama de transformações celestes.

Como os números eram os meios ou os símbolos pelos quais o significado das idéias universais abstratas podia ser compreendido, ao longo do tempo acabaram sendo substituídos pelas próprias idéias. Os filósofos do número eram ensinados no início de seus estudos a pensar em crescimento e desenvolvimento em termos do número, a considerar as realidades cósmicas em seus estados progressivos como a seqüência da progressão numérica. Os números se tornaram identificados com esses vários estados.

Conseqüentemente, na filosofia mágica aludir ao zero, por exemplo, significa sugerir em primeiro lugar a essência imanifesta do universo antes mesmo do nascimento das palavras, o ilimitado e a imutabilidade do espaço infinito no qual não há nem estrelas nem sóis, nem planetas nem homens. O círculo, um zero (0) na sua forma, era assim considerado como sendo uma representação adequada daquela realidade primordial que proporcionara existência a todas as coisas vivas e seres vivos em toda a vastidão do espaço.

O ponto, metafísico e espiritual, que aparece num acordo estrito com a lei cíclica, era representado por um traço ou uma linha estendendo-se do alto à base do círculo, uma figura ereta do um. O próprio número passou então a indicar o processo de germinação dos mundos. Cada número, em virtude do processo evolutivo ao qual originalmente se aplicava, conseqüentemente significava o próprio processo. Por conseguinte temos a base racional das figuras geométricas, dos selos e dos símbolos empregados nas cerimônias mágicas.

À medida que a filosofia da Qabalah for revelada, o leitor perceberá quais são as implicações fundamentais na raiz dos signos e símbolos usados pela teurgia. E será percebido claramente que não se trata mais de signos arbitrários de conotação dúbia, mas sim de realidades rigorosas investidas de uma augusta verdade. Devo pedir insistentemente ao aprendiz, entretanto, que seja paciente comigo por enquanto neste e nos capítulos subseqüentes, visto que estou lidando com um assunto sumamente complexo e difícil. Não importa quão bem se apresenta uma simplificação para o estudo geral, ela sempre exigirá uma detida atenção e muita aplicação.

Acima de tudo a filosofia da Qabalah é uma filosofia da evolução. O universo, com todos seus planetas, mundos e seres independentes, foi concebido como a emanação de um princípio-substância primordial que alguns chamaram de Deus, de Absoluto, de Infinito, de Todo e assim por diante. Na Qabalah, esse princípio, que é a Realidade Única, é chamado de Ain Soph, o Infinito. O Sepher haZohar, talvez o mais importante dos textos qabalísticos, o concebe imutável, incognoscível para a mente, ilimitado, imanifesto e absoluto. Além de toda compreensão intelectual em Si, visto que jamais poderia ser abarcado por uma mente que é apenas um segmento de Sua toda-inclusividade, afirma-se ser Ele Ain – nada.

Visto que ultrapassa efetivamente toda compreensão finita, sendo suas vastidões imutáveis e ilimitadas para a mente humana, cuja especulação mais profunda seria incapaz de aproximar-se do mais vago esboço do que Ele é em Si, forçoso é que permaneça sempre um vazio misterioso – nada, nenhuma coisa. Nesse sentido, a concepção gráfica dos antigos egípcios mostra-se bastante expressiva, bem como pitoresca. O céu, ou espaço anterior a toda manifestação, era concebido como o corpo nu da deusa Nuit, a rainha do espaço infinito, de seus seios brotando o leite das estrelas, as águas primordiais da substância.

Tudo o que pode ser dito de verdadeiro dessa Realidade Absoluta e Suprema é que ELA É. Isto tem que bastar. Onipresente, eterno e auto-existente – essas são idéias que transcendem mesmo os mais sublimes vôos da imaginação treinada, abstrações além da apreensão das mentes mortais. Um dos símbolos dessa potencialidade do Ain durante um período de repouso é um círculo, significando que tudo tendo sido recolhido à homogeneidade, o movimento retorna perpetuamente para si mesmo, como no glifo a cauda da serpente se recolhe e é tragada pela cabeça. O círculo só é interrompido, por assim dizer, pela lei da periodicidade. Essa lei, que a tudo afeta e que é inerente à própria natureza das coisas, governa o constante fluxo e refluxo, aparecimento e desaparecimento dos mundos. A potencialidade do Ain Soph é apenas refletida mediante a emanação de si mesmo do alento de criatividade, com o começo de um ciclo quando a Vida Una é polarizada no espírito e matéria. A ruptura do círculo de movimento incessante é realizada por uma contração de sua Luz Infinita, por uma colocação de um ponto minúsculo de refulgência cintilante nos confins do espaço. Como foi efetivada essa concentração de luz num centro cósmico, qual sua obscura origem, somos incapazes de dizê-lo.

Há explicações confusas quanto à Vontade do Ain Soph ou à lei dos ciclos, mas elas realmente não nos conduzem a uma satisfatória compreensão inteligente. Num caso, é inteiramente impossível conceber uma condição espiritual tão infinita e tão abstrata como o Ain Soph possuindo uma Vontade que possa ser posta em operação, tanto quanto possuindo uma mente ou um corpo. Segundo a tradição filosófica, Ain Soph não é nem Espírito nem Vontade, mas sim a causa subjacente de ambos; não é força ou matéria, mas aquilo que serve de base a elas, sua causa última. No segundo caso, o postulado da lei cíclica que pretende dar conta do aparecimento do centro de luz trata de algo independente do Ain Soph ou que impõe necessidade sobre ele. Se a lei cíclica é identificada com o Absoluto, o postulado se torna idêntico à Vontade de manifestação. Em qualquer dos casos, desde que concordemos no domínio da teurgia que a razão não pode ser o árbitro final no que diz respeito a isso e questões metafísicas similares, a tradição filosófica será simplesmente aceita como afirmação árida, sem a pretensão de esforçar-se para suprir explicações racionais para um centro cósmico de esplendor surgido no espaço.

Esse centro metafísico cósmico é chamado de Kether, a coroa, e é a primeira manifestação do Desconhecido, uma concentração de sua luz infinita. Kether é, também, num certo sentido desconhecido, o Zohar o chamando de o Oculto. Blavatsky o considera como o primeiro Logos, imanifesto, pois a partir dele tanto o espírito quanto a raiz da matéria cósmica ainda nascerão. Seu número é um, pois o ponto no círculo alongado e traçado como um traço reto é esse número.

Como a coroa que está acima do sistema de emanação, como o ápice da Árvore da Vida que tem sua raízes nos céus, descendo em desenvolvimento rumo à terra, Kether é o sentido mais profundo da egocidade, constituindo o substrato da consciência humana e a raiz última da substância. Esse ponto central, sensível e espiritual, este centro metafísico ou mônada metafísica de consciência, preenche essas duas exigências, existindo como a real individualidade e a divisão última da matéria. Da mônada brota a dualidade, dois princípios distintos de atividade permanentes através de um período inteiro de manifestação, co-existente e co-eterno. Trata-se da consciência e da base substantiva metafísica sobre a qual a consciência sempre atua, substância da raiz cósmica.

Um é chamado de Chocmah – sabedoria, e ao outro atribui-se o título de Binah – compreensão. Com o intuito de tornar coisas abstratas um pouco mais compreensíveis às mentes que se esforçavam para instruir nessa metafísica, uma das características dos filósofos cabalistas era explicar, na medida do possível, seus complexos e difíceis teoremas em termos de conduta humana, atividade humana e emoção humana. Assim notamos que é dado o título de Pai a Chocmah e de Mãe a Binah. Todas as Sephiroth, como são chamadas essas emanações, abaixo daquela que é chamada de Coroa, recebem atribuições masculinas e femininas, e a atividade entre Sephiroth masculinas e femininas em reconciliação é um “filho”, por assim dizer; uma Sephirah neutraatuando em equilíbrio. Assim, a Árvore da Vida, compreendendo essas dez emanações, se desenvolve a partir da mais elevada abstração até o mais concreto material em várias tríades de potências e forças espirituais. Masculino, feminino e criança; positivo, negativo e sua resultante mescla num terceiro fator reconciliador.

Esses dois princípios ou Sephiroth, ao serem intitulados o Pai e a Mãe, são também atribuídos a letras do chamado Tetragrammaton, do qual as quatro letras são YHVH. Relativamente a essa doutrina do Tetragrammaton, devo lembrar o leitor que as atribuições desse nome e os modos de emprego exegético são sumamente importantes, e quanto mais clara e precisa for a compreensão desses, mais claro e preciso será o discernimento das fórmulas práticas de magia a serem consideradas posteriormente. O Pai recebe a letra “Y” desse nome e o primeiro “H” é atribuído à Mãe. Da união de Y e de H flui o resto de todas as coisas criadas. Em outras palavras, da consciência e seu veículo todas as coisas são formadas, e todo ser concebível, deus ou homem, divino ou animal, tem sua base no Y e no H do nome divino.

Deve-se mencionar, de passagem, que a postura adotada pelo que é conhecido como Ciência Cristã ao negar a existência da matéria não é ratificado pela filosofia dos teurgos. É verdade que esta última afirma que o mundo físico é uma ilusão, a saber, no sentido de que suas formas externas estão em constante mutação, que se encontra num estado de fluxo perpétuo. Desse ponto de vista, quando observado “de cima”, acredita-se ser o universo uma ilusão. Mas sua existência está fundada numa realidade, a substância-raiz de Binah,distinta e separada do aspecto consciência de Chocmah. Nesse ponto apenas, deixando de lado várias outras brechas para discussão, a magia não tem qualquer interesse pela Ciência Cristã ou algo em comum com ela. Tanto o espírito quanto a matéria são reais, quer dizer, reais durante um período de manifestação; em si mesmos são apenas modos passageiros da atividade, por assim dizer, do Ain Soph.

Expandindo através da totalidade do espaço, usando Binah como um veículo imediato, as energias de Chocmah dão origem às sete emanações restantes que resultam no aparecimento do mundo físico tangível. Em Chocmah, o plano de mundo ideal ou imaginativo pelo Logos que está em Kether, as idéias sobre as quais o “mundo que virá a ser” se baseará. No Livro dos Mortos do Antigo Egito, o deus Tahuti ou Thoth*, a divindade atribuída a Chocmah, visto que as características essenciais de ambos são idênticas, é ali concebido como tendo sido a “língua” do criador Ptah, e ele sempre proclamou a Vontade do grande Deus, falando as palavras que ordenavam a todo ser e toda coisa no céu que adentrasse a existência.

Sir E. A. Wallis Budge, o eminente egiptologista, observa no folheto informativo do Museu Britânico que trata de O Livro dos Mortos que “Thoth concebeu as leis pelas quais o céu, a Terra e todos os corpos celestes são mantidos; ele ordenou os cursos do sol, da lua e das estrelas”. Isso está em harmonia total com a natureza de Chocmah, a ideação ou imaginação do cosmos, em que todas as coisas foram primeiramente concebidas e então realizadas e tornadas manifestas em substância.
* Tahuti ou Tehuti é egípcio, Thoth é copta. (N. T.)
(Israel Regardie)



HORUS, NUIT e ANUBIS


HÓRUS:

Era originalmente o deus do céu, voando sobre o Egito como um falcão para proteger seu pai, o rei Osíris. Quando Horus derrotou o assassino de seu pai, Seth, ele se transformou no rei de todo o Egito, e ele é descrito usando uma coroa com uma parte superior branca para representar o Alto Egito e uma parte vermelha inferior para representar o Baixo Egito. Por esta razão, os governantes do Egito sempre se identificaram com Horus na vida, se transformando na personificação de Osíris quando eles morriam.

Hórus, para os antigos egipicios, é considerado a encarnação de Rá na terra, a manifestação fálico solar no plano material, o princípio do fogo. É um deus gêmeo, possuindo aspecto duplo: um ativo como heru-pa-khrat, ou Hárpocrates parao gregos no período Ptolomaico; e um aspecto ativo, como Ra-heru-Khuit podendo ser escrito também como Ha-roor-Khuit, o seu aspecto marcial.
O princípipo hermético da polaridade está presente na sabedoria iniciatica egípcia, compreendendo a natureza nos seus aspectos ativos/passivos como complemetares.
Harpócrates, o Hórus menino, é o primeiro iniciador e seu sinal, o do Silencio (colocando-se o dedo indicador da mão diretia sobre os lábios), já era um Sinal utilizado nos templo egípios simbolizando a iniciação pelo silêncio, para um contato com Num, as águas primordiais da vida (Nuit), através da quietude interna. Era um Sinal sempre feito nos Templos antes de se iniciar toda toda prática, por mais simples que esta pudesse ser.

O Deus Hórus, senhor do presente Aeon. Horus era adorado em centros de cultos em Behdet, Hirakonpolis e Edfu e o olho de Horus era considerado um amuleto poderoso.

Em Thelema, Hórus é o Deus Falcão, o Senhor da dupla Baqueta de Poder, que destrói os últimos resquícios do antigo Aeon de Osíris. Ra-Roor-Khuit traz em seu interior a criança Heru-pa-khrat, que é a criança do novo aeon, traz o novo aeon dentro de si.

O Olho de Hórus é também chamado de "Olho no Triângulo" e segundo Viviane Crowley, no livro "Cabala - um enfoque feminino", a imagem deste Olho representa Ain Soph, Kether, Chokmah e Binah.

O Ain Soph seria a pupila escura; Kether o círulo em volta da pupila, a íris. Chokmah está em torno disto, dando a forma oval do Olho e Binah é o triângulo (a base para o mundo tridimencional).

Segundo Marisa Castelo Branco, no livro "Do Egito Milenar à Antiguidade", o hieróglifo do Olho de Hórus significa ver, construir, criar, sendo que a palavra em egípicio que o representa é UDJAT e este simboliza um bastão por meio do qual se obtinha o fogo.

A autora disserta também que o símbolo é oriundo do Olho de Rá e, deste modo, o Olho era o signo R (a boca) com o Sol no meio, simbolizando também o verbo criar.
No papiro de Nesiamsu é dito que os homens foram criado das lágrimas de deus.
Assim sendo, a autora justifica que no Olho de Rá ou Olho de Hórus representa as lágrimas do criados, representado pelo hieróglifo QD (uma estaca em construção e também o verbo construir) e simbololiza Osíris que desceu à terra para trazer os primórdios da civilização.

A segunda lágrima é representada pelo hieróglifo de uma espiral das forças construtivas da natureza, simbolizando Hórus.



NUIT:
Na mitologia egípcia, Nuit era a deusa dos céus, ao contrário de muitas outras mitologias, onde o Pai dos Céus é quase sempre uma figura masculina. Nuit é a filha de Shu e Tefnut. Ela era uma do Grupo dos nove.

Rá, o deus do sol entrou em sua boca após o pôr-do-sol no anoitecer e renasceu de sua vulva na manhã seguinte. Ela também engoliu e renasceu as estrelas.

Ela era a deusa da morte, e sua imagem está no lado de dentro da maioria dos sarcófagos. O faraó entrava no corpo dela após a morte e posteriormente era ressuscitado.

Na arte, Nuit é representada como uma mulher sem roupas, cobertas com as estrelas e sustentada por Shu; o oposto a ela (o céu), é o seu marido, Seb (a Terra). Com Seb, ela foi a mãe de Osíris, Ísis, Set, e Néftis.

Alternativas: Nu, Nut

Curiosamente, o francês nuit significa "noite".

No túmulo de Tutankhamon foi encontrado junto a sua múmia um peitoral no qual era invocado a proteção desta deusa: “Nut minha divina mãe, abre tuas asas sobre mim enquanto brilharem nos céus as imorredouras estrelas”.

Nuit é a principal oradora no primeiro capítulo do Livro da Lei e o cumprimento feminino ao deus Hadit. Nuit é o círculo infinitamente vasto cuja circunferância é incomensurável e cujo centro está em toda parte. Hadit é o ponto infinitamente pequeno dentro do núcleo de todas as coisas. A união dos dois é ainda um outro glifo da Grande Obra.


ANUBIS:
É um deus egípcio geralmente retratado como um homem com cabeça de chacal, ou um chacal negro em posição de esfinge (este último geralmente guardando algo ou alguém) Anúbis, o Juiz dos Mortos também conhecido como Anupu, ou Anpu, é o antigo deus egípcio dos mortos e do submundo.

Anúbis é filho de uma união extraconjugal entre Nephtys e Osíris, onde a primeira, esposa do terrível deus Set, faz-se passar por Ísis, a verdadeira esposa de Osíris para poder desfrutar de seu amor incondicional. Temendo a vingança cruel de Seth ao descobrir sobre sua gravidez, Néftis, também mãe de Sebek (o deus com cabeça de crocodilo) esconde o bebê Anúbis em um pântano, onde mais tarde Ísis, sua tia, o encontra e cria longe do alcance maléfico de seu tio Seth.

Anúbis então crescido adquire inúmeras tarefas como deus da morte e do submundo, e todos seus aspectos relacionados, como o julgamento, ritos de passagem e as tarefas de embalsamamento. Mais tarde, com a morte de Osíris por seu tio Seth, após Ísis e Néftis terem reunido os pedaços esquartejados de Osíris Anúbis se voluntaria para trazê-lo de volta a “vida”, através das práticas de mumificação e de seu infinito conhecimento sobre a pós-vida, tendo sido assim criada a primeira múmia do Egito e do mundo.

Após este ato Osíris, que originalmente era um deus da agricultura, por seu status morto-vivo e seu status de divindade maior, “usurpa” então os aspectos de Anúbis, de deus da morte e do submundo.

Anúbis então passa a se dedicar aos outros aspectos relacionados a Morte. Ele passaria a guiar as almas através do submundo, até os salões do julgamento, onde ele também pesaria o coração da alma contra a pena de Maat, a deusa da justiça, do equilíbrio e da verdade, em um tribunal presidido por Osíris, Toth e perante 42 deuses menores, cada um incumbido de julgar uma das 42 confissões que a alma deveria fazer.

Também era o patrono da cidade de Cinópolis, o patrono dos embalsamares e dos conhecimentos obscuros.

Após as invasões Gregas em 332a.c. e Romanas em 31a.c., onde apenas um ano mais tarde o Egito tornaria-se um estado vassalo de Roma, muitos de seus deuses foram "exportados", entre eles Ísis, Toth e Anúbis, que mais tarde, formaria junto com Hermes um híbrido conhecido como Hermanúbis. E as mumificações e necrópoles tornaram-se muito mais populares e espalhadas pelos impérios Grego e Romano, até hoje surpreendendo arqueólogos com seu estilo diferenciado.

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ÁRVORE DA VIDA - Um Estudo Sobre Magia II




CAPITULO II
É bastante provável que de maneira tonitruante seja emitida de certas fontes a condenação de que o sistema indicado nesta obra como magia faz somente referência ao princípio da constituição humana pertinente exclusivamente à natureza inferior. Em decorrência dessa classificação, não é difícil antecipar que toda a técnica teúrgica venha a ser inteiramente condenada como “psiquismo”, por exemplo, nos círculos teosóficos. Na verdade, como poucas considerações bastariam para demonstrar, tal condenação é mal colocada e injustificada. A fim de retificar esse ponto de vista de uma vez por todas, apresentamos A árvore da vida ao público leitor. Abomino essa loquacidade teosófica.

Permitam que registre aqui minha repugnância por suas classificações demasiado simplistas, sua contínua disposição de aplicar rótulos de mordaz opróbrio a coisas parcialmente compreendidas. Não fosse o caso de sentir-me tão profundamente envolvido com a magia – sustentando que nela possa ser encontrado o meio de tomar o reino dos céus de assalto – esse abuso e propositada censura dos teósofos seria merecidamente ignorado e relegado àquela esfera de desprezo a que com justiça pertencem. Tem havido em geral excessiva incompreensão quanto ao que é a magia e qual a ação por ela orientada. É tempo de esclarecer de uma vez por todas essa fonte contínua de confusão por meio da formulação dos princípios elementares de sua arte.

Em sua renomada obra Estâncias de Dzyan, em torno da qual toda a A doutrina secreta* se acha organizada como um comentário, Madame Blavatsky nos informa que cada homem é uma sombra ou centelha de uma divindade de sabedoria, poder e espiritualidade superlativos. Esses seres sensíveis são chamados de deuses ou Essências universais por uma das autoridades em teurgia. Uma autoridade em teosofia da atualidade, o dr. Gottfried de Purucker escreve o seguinte:

“A parte mais refinada da constituição do ser humano é, em cada caso, um filho da parte espiritual de um ou outro dos gloriosos sóis espalhados pelo espaço sem fronteiras. Vós sois deuses em vossas partes mais interiores, átomos de algum sol espiritual...”

A definição conferida a um deus em A doutrina secreta é a de um ser hierárquico que nas épocas mais remotas do empenho evolutivo, há muitíssimo tempo, era um ser humano tal como o somos agora. Por meio de esforço e progresso consciente uniu-se àquela Realidade Espiritual difundida através das ramificações e fundações do universo. Por ocasião dessa união, entretanto, a individualidade essencial da experiência foi retida. Mas transcendida a personalidade, o ser retomou seu papel natural de dirigente, por assim dizer, ou Regente do universo, ou de alguma porção ou aspecto particular do universo. Visto que, baseado nessa definição, o homem é a centelha de uma tão grandiosa consciência, um filho dos deuses cósmicos, o curso de sua vida só poderá se orientar para o aspirar pela união com seus progenitores espirituais. Tanto a origem da magia quanto sua raison d’être se encontram na efetivação dessa união.
* Publicação da Ed. Pensamento. (N. T.)

Espero mostrar nestas páginas que a técnica da magia está em estreito acordo com as tradições da mais remota Antiguidade, e que conta com a sanção, explícita ou implícita, das mais excelentes autoridades. Jâmblico, o divino teurgo, tem muito a dizer em seus vários escritos sobre a magia; do mesmo modo em Proclo e Porfírio, e mesmo na moderna literatura teosófica oficial, há obscuras referências, embora inexplicadas e jamais desenvolvidas, à magia divina. Diversas boas invocações procedentes dos registros gnósticos e as várias recensões do Livro dos Mortos serão apresentadas próximo à conclusão deste livro, e pesquisas baseadas nas concepções mágicas egípcia e qabalística nos demais capítulos deste livro.

Resumir, portanto, a magia de maneira vaga com a única palavra “psiquismo” é um completo absurdo, para dizer o mínimo. Conheço teósofos, todavia, e percebo a necessidade de antecipar suas objeções com ampla contraposição. O mago tem que estar no controle de toda sua natureza; todo elemento constituinte em seu ser precisa ser desenvolvido sob a vontade ao auge da perfeição. Princípio algum deve ser reprimido, já que cada um é um aspecto do espírito supremo, tendo que cumprir seu próprio propósito e natureza. Se o teurgo se envolve, por exemplo, com viagem astral – parte da Grande Obra à qual as objeções da teosofia serão mormente dirigidas – assim será por três razões principais:

Primeira,na chamada luz astral ele pode perceber um exato reflexo de si mesmo em todas as suas várias partes, qualidades e atribuições, sendo que um exame desse reflexo tende naturalmente para uma espécie de autoconhecimento. Segunda, a definição da luz astral do ponto de vista mágico é extremamente lata, incluindo todos os planos sutis acima ou no interior do físico, o objetivo do mago sendo ascender constantemente aos domínios mais fervorosos e mais lúcidos do mundo espiritual. Os elementos mais grosseiros da esfera de Azoth, com suas imagens sensórias e visões opacas obscurecidas, precisa ser sempre transcendido e deixado bem atrás.

Éliphas Lévi chega a estabelecer, por razões de ordem prática, apenas duas grandes classes de planos no universo: o mundo físico e o mundo espiritual. Terceira, antes que essa porção particular do mundo invisível possa ser transcendida, é necessário que seja conquistada e dominada em cada um de seus aspectos. Todos os habitantes dessa esfera têm que ser submetidos ao mago, aos seus símbolos mágicos e obedecer inequivocamente à realidade da Vontade Real que esses últimos simbolizam. No nosso plano e em nosso domínio de vigília da experiência ordinária, os símbolos são meramente representações arbitrárias de uma significação inteligível interior. São as assinaturas visíveis de uma dignidade metafísica ou espiritual, por assim dizer. Na luz astral, entretanto, esses símbolos assumem existência independente revelando sua realidade tangível, e conseqüentemente são de máxima importância. As evocações são empreendidas pelo mago não por curiosidade ou para satisfazer a uma sede pelo poder, mas sim com a finalidade única de trazer essas facetas ocultas de sua própria consciência para o âmbito de sua vontade, submetendo-as então ao seu domínio.

Pode-se, talvez, definir como objeto do psiquismo o estímulo e a preservação do eu inferior às expensas ou na ignorância do eu superior. Trata-se de uma abominação merecedora da mais severa censura. Na magia não se fazem tentativas para aquisição de poderes em proveito próprio, ou com qualquer propósito abjeto ou nefando. Qualquer poder adquirido deve instantaneamente ser subordinado à vontade, e mantido em seu próprio lugar e adequada perspectiva. Essa questão de poderes é bastante curiosa, tendo obtido, devo acrescentar, maior destaque em meio ao público somente a partir do advento do culto ao espiritualismo e da formação das organizações teosóficas. Por que os indivíduos – particularmente alguns teósofos – cobiçam ou encaram como encaram os poderes astrais ou outros poderes ocultos para sua própria vantagem e uma morbidez patológica que escapa a minha compreensão.

No início de sua carreira, o mago é compelido a compreender que sua exclusiva aspiração diz respeito ao seu eu superior, ao seu Santo Anjo Guardião, e que quaisquer faculdades que sejam obtidas precisam ser subordinadas a essa aspiração. Qualquer trabalho menor que seja realizado necessita ter um motivo espiritual definido. Uma aspiração por qualquer coisa que não seja o Santo Anjo Guardião* constitui realmente, salvo raras exceções, um ato de magia negra que é, portanto, sumamente abominável. Deve ficar, por conseguinte, óbvio para todos que o psiquismo, entendido como o desejo de poderes psíquicos anormais que sirvam como fim em si mesmos, é absolutamente estranho à intenção e meta dessa técnica.

Uma outra objeção a ser levantada provavelmente é que a magia pode levar à mediunidade. Esta é também uma crítica improcedente por várias razões. Tem sido observado corretamente que tanto o médium quanto o mago cultivam o transe. Mas a exatidão da observação pára por aí, pois entre os respectivos estados de consciência do médium e do mago há uma colossal diferença.

Na linguagem popular encontramos a idéia vulgar segundo a qual gênio e loucura estão associados. A distinção efetiva é que num caso o equilíbrio de gravidade está acima do centro normal da consciência; no outro encontra-se abaixo, e a consciência de vigília foi invadida por uma horda inicial de impulsos subconscientes descontrolados. Idéia idêntica se aplica ainda com maior força à comparação do médiumcom o mago, pois o médium cultiva um transe passivo e negativo que arremessa seu centro de consciência para baixo, para o interior do que podemos chamar de Nephesch.

O mago, por outro lado, é intensamente ativo tanto de um ponto de vista mental quanto espiritual, e embora ele também se empenhe no transe noético para manter os processos de raciocínio em suspensão, seu método consiste em elevar-se acima deles, abrir-se para os raios telésticos do eu superior de preferência a descer a esmo ao limo relativo de Nephesch. É esta a única diferença. O cultivo da vontade mágica e a conseqüente exaltação da alma é a técnica da magia. O transe espírita não é nada mais nada menos que uma descida não-natural à inércia e à consciência animal. Abdica-se de toda humanidade e divindade no transe passivo negativo a favor da vida animal e da obsessão demoníaca. A abdicação do ego racional no caso do mago ocorre em favor de uma realização espiritual noética, não do torpor da vida instintiva e vegetativa. Por conseguinte, a magia não está associada sob qualquer ponto de vista à mediunidade passiva.

Antes de passar à exposição dos princípios fundamentais da magia, é necessário esclarecer minha posição no que concerne às fontes de filosofia teórica que estão na base de minha interpretação pessoal da técnica da magia. Ficará bastante óbvio que estou em grande débito com a teosofia. Muitas práticas mágicas encontram sua base na Qabalah Prática dos filósofos hebreus e na teurgia sacerdotal dos egípcios. Fragmentos foram selecionados de várias fontes e sou grande devedor de um grande número de pensadores anteriores a mim e também contemporâneos, e a todos sou grato.

No que diz respeito a teosofia, acho uma questão de honestidade confessar – a despeito das observações depreciativas aqui registradas contra a conduta de certos teósofos – que por Blavatsky só posso alimentar a maior admiração e o maior respeito. Muito da superestrutura filosófica exibida em A doutrina secreta só indica tácita aquiescência e sincera concordância com minhas idéias.

Minha própria concepção da filosofia mágica deve o que há nela de concatenado e claro aos desenvolvimentos em religião e filosofia comparadas dos quais Blavatsky me muniu. Todavia, minha postura é eclética, selecionando aqui, rejeitando ali, e formando a partir do todo uma síntese coerente e consistente que agrade ao intelecto e satisfaça à alma. Sinto que não posso aceitar a totalidade do ensino de Blavatsky em várias de suas comunicações. Há muito com o que simpatizo inteiramente, com o que se experimenta a um tempo orgulho e felicidade assimilando-se a própria filosofia pessoal, e, ao mesmo tempo, há muito que desagrada e repugna o senso interior.

Também muito devo, e não em menor grau, às obras de Arthur Edward Waite, em particular a seus resumos do ensino qabalístico. Há uma quantidade considerável de boa literatura escrita por esse agora idoso contemporâneo que é sumamente encantadora, informativa e sublime, entoando cantos por vezes de incomparável eloqüência. E é esse aspecto de excelente erudição e lirismo que acho não deve ser esquecido, embora algumas vezes pareça arruinado pela freqüência de passagens em seus escritos que provocam justificável reprovação. São de uma turgidez e pomposidade abismais, e exibem uma tendência desnecessária à crítica destrutiva. Mas eu, no que diz respeito aos sentimentos pessoais, tenho um lugar cálido no fundo de meu coração para o sr. Waite, e lhe devo bem mais do que meras palavras são capazes de expressar, e a título de suplementação ao presente estudo recomendo enfaticamente a todos os leitores o seu Doutrina secreta em Israel e A Santa Cabala.

Embora nas obras do eminente mago francês cujo pseudônimo era Éliphas Lévi Zahed haja muita tagarelice sem sentido que não tem a menor conexão com a magia, percebe-se aqui e ali no Dogma e ritual da Alta Magia e em suas outras obras, cintilando como estrelas no bojo do firmamento, reluzentes pepitas do mais puro ouro no negro minério da obscuridade e da trivialidade. Devo confessar, contudo, estar pouco impressionado em todos os aspectos com sua própria ficha como mago prático, visto que, ao que tudo indica, a sua chamada evocação da sombra de Apolônio de Tiana resultou em pouquíssimo.

Lévi constitui um problema difícil para a maioria dos leitores. Ademais, ele sobrecarregou a si mesmo com uma confusão, ou uma tola tentativa de reconciliar a magia com o catolicismo romano. Assim, sem uma sólida compreensão dos princípios fundamentais da Qabalah e da filosofia comparativa ficará sujeito a ser arremessado de cabeça nos vários fossos que ele supre para os incautos.

S. L. McGregor Mathers e W. Wynn Westcott também me forneceram muito que servisse de fundamento nesta filosofia mágica, particularmente o primeiro, e muito material útil pode ser reunido a partir das obras de ambos. O mundo terá de ser eternamente grato a Mathers por sua tradução de O livro da Magia Sagrada de Abramelin, o Mago e A Introdução ao Estudo da Cabala, de Westcott é talvez um dos mais atraentes textos elementares a respeito desse assunto. Entretanto, a aceitação da totalidade das opiniões desses escritores levaria a uma crise aguda de indigestão mental. Em cada um há vários elementos da verdade – verdade, ao menos para cada aprendiz – mas sondando o fundo observa-se um ligeiro resíduo de exagero, mal-entendidos e erro.

Observar-se-á, igualmente, que faço freqüentes citações de Aleister Crowley, e é imperioso que eu defina claramente minha posição relativamente a esse homem genial. Deixando de lado o opróbrio de magia negra que lhe foi dirigido violentamente por muitos indivíduos completamente ignorantes do que ele ensinou, há muita coisa importante em Crowley, muita filosofia e pensamento original tanto sobre Qabalah quanto sobre magia belamente expressos em prosa e verso e de concepção profunda.

Acho lamentável que o público seja privado dessa novidade e originalidade superlativas que pertencem a Crowley e despojado daqueles aspectos de seus ensinamentos que são bons, enaltecedores e duradouros, simplesmente por causa de uma certa parte de sua produção literária que é certamente banal, insignificante, sem importância e indubitavelmente repreensível.

As personalidades e vidas particulares desses indivíduos não me dizem respeito em absoluto, e não me sinto inclinado a discuti-las. Quase todos eles, numa ocasião ou outra, foram atingidos pelas ferroadas e setas do mau juízo de uma multidão maliciosa. Também não me dizem respeito nem esta multidão nem a natureza das invectivas que lançam, pois a magia nada tem a ver com elas.
A cada aprendiz, portanto, cabe a tarefa de determinar para si mesmo o que deve ser verdadeiro e confiável e estabelecer por sua própria conta um padrão de referência sem controvérsia. E esse padrão deve ser experiência espiritual. Por isso, a Árvore da Vida Qabalística foi adotada como a estrutura da magia prática, visto que está, em primeiro lugar, aberta à classificação sintética e construtiva, e porque fornece aquilo que pode ser apropriadamente chamado de alfabeto mágico.

É preciso notar que a palavra “alfabeto” é empregada, e empregada de preferência à palavra linguagem e aos seus desdobramentos. A Qabalah não procura suprir uma completa linguagem mágica ou uma inteira filosofia. Essa última só pode ser conquistada mediante experiência espiritual. Mas a partir do alfabeto de idéias, números e símbolos e das sugestões apresentadas por ele, o aprendiz poderá se achar capacitado, com o auxílio da pesquisa mágica, a construir um edifício satisfatório de elevada filosofia que o conduzirá ao longo da vida.

(Israel Regardie)

ÁRVORE DA VIDA - Um Estudo Sobre Magia


PRIMEIRA PARTE

É expressão comum nos lábios de muitos a reiteração de que a espécie humana hoje, com todas suas enfermidades e aberrações, chafurda às cegas num terrível pântano. Mensageiro da morte e munido de tentáculos de destruição, esse pântano colhe a espécie humana com crescente firmeza para seu seio, ainda que com grande sutileza e furtivamente. Civilização, por mais curioso que seja, civilização moderna é o seu nome.

Os tentáculos, que são os instrumentos inconscientes de seus golpes catastróficos, partem da estrutura enferma, falsa e repugnante do sistema social decadente e do conjunto de valores em que estamos envolvidos. E agora, toda a textura do mundo social parece estar em processo de desintegração. Pareceria que a estrutura da ordem nacional está mudando da ruína econômica para aquele abandono derradeiro e insano que pode contemplar a extinção dessa estrutura num precipício escancarado rumo à completa destruição. Enraizados firmemente na plenitude da vida individual, os até aqui robustos bastiões de nossa vida estão sendo ameaçados como jamais o foram. Parece cada vez mais impossível diante do poente de cada sol para qualquer um reter mesmo a mais ligeira porção de seu legado divino e individualidade e exercer aquilo que faz de nós homens.

Apesar de terem nascido em nossa época e tempo, aqueles poucos indivíduos que estão cientes mediante uma certeza isenta da dúvida de um destino que os impulsiona imperiosamente rumo à realização de suas naturezas ideais, constituem, talvez, as únicas exceções. Estes, a minoria, são os místicos de nascimento, os artistas e os poetas, os que contemplam além do véu e trazem de volta a luz do além. Encerrada dentro da massa, contudo, existe ainda uma outra minoria que, embora não plenamente consciente de um destino imperioso, nem da natureza de seu eu mais profundo, aspira ser diferente das massas complacentes. Presa de uma ansiedade íntima, mantém-se inquieta na obtenção de uma integridade espiritual duradoura. É impiedosamente oprimida pelo sistema social do qual constitui parte e cruelmente condenada ao ostracismo pela massa de seus camaradas.

As verdades e possibilidades de um contato reintegrador com a realidade que pudesse ser estimulado aqui e agora, durante a vida e não necessariamente por ocasião da morte do corpo, são cegamente ignoradas. A atitude singularmente tola adotada pela maior parte da moderna humanidade européia “inteligente” para com essa aspiração constitui um grave perigo para a raça, a qual se permitiu com demasiada impaciência o esquecimento daquilo de que realmente depende, e de que é continuamente nutrida e sustentada tanto em sua vida interior quanto exterior. Agarrando-se avidamente à evanescência flutuante da precipitada existência exterior, sua negligência com relação aos assuntos espirituais somada à sua impaciência para com seus semelhantes mais perspicazes constitui um marca de fadiga e nostalgia extrema.

Embora desgastado, o adágio “onde não há visão as pessoas perecem” não deixa de ser verdadeiro e digno de ser repetido porquanto expressa de maneira peculiar a situação hoje preponderante. A humanidade como um todo, ou mais particularmente o elemento ocidental, perdeu de algum modo incompreensível sua visão espiritual. Uma barreira herética foi erigida separando a si mesma daquela corrente de vida e vitalidade que, mesmo atualmente, a despeito de impedimentos e obstáculos propositais, pulsa e vibra ardentemente no sangue, invadindo a totalidade da estrutura e forma universais. As anomalias que se nos apresentam hoje se devem a esse rematado absurdo.

A espécie humana está lentamente cometendo seu próprio suicídio. Um auto-estrangulamento está sendo efetivado mediante uma supressão de toda a individualidade, no sentido espiritual, e de tudo que a tornou humana. Prossegue sonegando a atmosfera espiritual de seus pulmões, por assim dizer. E tendo se separado das eternas e incessantes fontes de luz e vida e inspiração, eclipsou-se deliberadamente diante do fato – com o qual nenhum outro pode comparar-se em importância – de que existe um princípio dinâmico tanto dentro quanto fora do qual se divorciou. O resultado é letargia interior, caos e desintegração de tudo o que anteriormente era tido como ideal e sagrado.

Formulada há séculos, a doutrina ensinada por Buda é vista por mim como aquela que apresenta uma possível razão para esse divórcio, esse caos e essa decadência. Para a maioria das pessoas, a existência está inevitavelmente associada ao sofrimento, à tristeza e à dor. Mas embora Buda tenha, com efeito, ensinado que a vida era repleta de dor e miséria, estou inclinado a crer, ao lembrar a psicologia do misticismo e dos místicos, dos quais era ele indubitavelmente um par, que esse ponto de vista foi por ele adotado tão-somente para impulsionar os homens fora do caos rumo a obtenção de uma modalidade de vida superior. Uma vez superado o ponto de vista do ego pessoal, resultado de eras de evolução, o homem pôde ver os grilhões da ignorância caírem por terra revelando uma paisagem desimpedida de suprema beleza, o mundo como uma coisa viva e júbilo infindável.

Não será visível para todos a beleza do sol e da lua, o esplendor das estações alternando-se ao longo do ano, a doce música do romper do dia e o fascínio das noites sob o céu aberto? E o que dizer da chuva escorrendo pelas folhas das árvores que se elevam aos portais do céu, e o orvalho na madrugada insinuando-se sobre a relva, inclinando-a com pontas de lança prateadas? A maioria dos leitores terá ouvido falar da experiência do grande místico alemão Jacob Boehme, que, após sua visão beatífica, penetrou os campos verdejantes próximos de seu povoado contemplando toda a natureza flamejante de luz tão gloriosa que até as tenras folhinhas de grama resplandeciam com uma graça e beleza divinas que ele jamais vira antes.

Considerando que Buda tenha sido um grande místico – superior, talvez, a qualquer outro de que o leitor médio tem conhecimento – e que detinha uma grande compreensão da atuação da mente humana, é-nos impossível aceitar em seu valor aparente o enunciado de que a vida e o viver constituem uma maldição. Prefiro sentir que essa postura filosófica foi por ele adotada na esperança de que mais uma vez pudesse a humanidade ser induzida a buscar a inimitável sabedoria que perdera a fim de restaurar o equilíbrio interior e a harmonia da alma, cumprindo assim seu destino desimpedida pelos sentidos e pela mente. Obstando este gozo estático da vida e tudo o que o sacramento da vida pode conceder, existe uma causa radical da dor. Em uma palavra, ignorância. Por ignorar o que em si é realmente, por ignorar seu verdadeiro caminho na vida, o homem é, como ensinou Buda, tão acossado pela tristeza e tão duramente afligido pelo infortúnio.

De acordo com a filosofia tradicional dos magos, cada homem é um centro autônomo único de consciência, energia e vontade individuais – numa palavra, uma alma – como uma estrela que brilha e existe graças à sua própria luz interior, percorrendo seu caminho nos céus reluzentes de estrelas, solitária, sem sofrer qualquer interferência, exceto na medida em que seu curso celeste seja gravitacionalmente alterado pela presença, próxima ou distante, de outras estrelas. Visto que nos vastos espaços estelares raramente ocorrem conflitos entre os corpos celestes, a menos que algum se extravie de sua rota estabelecida – acontecimento bastante esporádico –, nos domínios da espécie humana não haveria caos, haveria pouco conflito e nenhuma perturbação mútua se cada indivíduo se contentasse em estar firmado na realidade de sua própria consciência superior, ciente de sua natureza ideal e de seu verdadeiro propósito na vida, e ansioso para trilhar a estrada que tem de seguir. Por terem os homens se desviado das fontes dinâmicas a eles e ao universo inerentes, por terem abandonado suas verdadeiras vontades espirituais, e por terem ainda se divorciado das essências celestiais, traídos por um prato de guisado mais repugnante que qualquer um que Jacó tenha vendido a Esaú, o povo que o mundo hoje nos apresenta exibe aspecto tão desesperançado e uma humanidade vincada na sua aparência pelo desalento.

A ignorância do curso da órbita celeste e do seu significado inscrito nos céus perenemente constitui a raiz que se encontra no fundo da insatisfação, infelicidade e nostalgia da raça, as quais são universais. E por isso a alma viva brada por socorro aos mortos, e a criatura a um Deus silente. De todos esses brados geralmente nada resulta. As mãos erguidas em súplica não trazem qualquer sinal de salvação. O frenético ranger de dentes resulta tão-somente em desespero mudo e perda de energia vital. Só existe redenção a partir de nosso interior, e ela é lavrada pela própria alma mediante sofrimento e no decorrer do tempo graças a muito empenho e esforço do espírito.

Como, então, poderemos retornar a essa identidade estática com nossos eus mais profundos? De que modo pode ser realizada essa necessária união entre a alma individual e as Essências da realidade universal? Onde o caminho que conduziria finalmente ao aprimoramento e melhoramento do indivíduo e conseqüentemente à solução dos desconcertantes problemas do mundo dos homens?
...O aparecimento do gênio, independentemente dos vários aspectos e campos de sua manifestação, é marcado pela ocorrência de um curioso fenômeno acompanhado quase sempre por visão e êxtase supremos. Essa experiência a que faço alusão é indubitavelmente a indicação de qualidade e legitimidade e a marca essencial de realização genuína. Essa experiência apocalíptica não é concedida à mediocridade. À pessoa ordinária, carregada como se acha com o dogma e a tradição fatigada raramente ocorre esse lampejo de luz espiritual que faz sua descida em esplêndidas línguas de chama como o Espírito Santo de Pentecostes, radiante de alegria e da mais elevada sabedoria, prenhe de inspiração espontânea.

Os sofisticados, os saturados pelos prazeres, os diletantes – esses estão excluídos por barreiras intransponíveis dos méritos de sua bênção. Para os que têm talento tão-somente essa revelação não acontece, embora o talento possa ser um ponto de partida para o gênio. O gênio não é e nunca foi no passado simplesmente o resultado de zelo e paciência infinitos. Mas penso que pouca importância necessite ser dada à definição reiterada freqüentemente relativa a uma certa alta percentagem de transpiração associada a um reduzidíssimo restante de inspiração. Por maior que seja o valor da transpiração, ele não pode produzir os efeitos magníficos do gênio.

Em todo campo do empreendimento na vida cotidiana, em toda parte vemos realizada uma imensa quantidade de excelente labor, indispensável como tal, em que se vertem literalmente litros de suor sem que se evoque, de fato, uma fração de uma idéia criativa ou de uma exaltação. Essas expressões exteriorizantes do gênio – zelo, paciência, transpiração – são simplesmente as manifestações de uma superabundância de energia procedente de um centro oculto de consciência. Não passam de meios pelos quais o gênio se distingue, esforçando-se para tornar conhecidos aquelas idéias e aqueles pensamentos que foram arremessados para dentro da consciência e penetraram aquela linha divisória que logra demarcar e separar o profano daquilo que é divino.
O gênio em si é produzido ou ocorre concomitantemente com uma experiência espiritual da mais elevada ordem intuicional. É uma experiência que, trovejando do empíreo como um raio ígneo proveniente do trono de Júpiter, traz consigo uma inspiração instantânea e uma retidão duradoura, com uma realização de todos os anseios da mente e da constituição emocional.

Não pretendo investigar a causa primordial dessa experiência, familiar àqueles raros indivíduos cujas vidas foram assim abençoadas desde a sua tenra infância até os seus derradeiros dias. Uma tal investigação me levaria longe demais, conduzindo ao domínio de impalpabilidades metafísicas e filosóficas, no qual de momento não desejo ingressar. A reflexão, contudo, produz um fato bastante significativo. Aqueles indivíduos que receberam o título de “gênio” e foram chamados de grandes pela espécie humana foram os receptores de uma tal inimitável experiência que mencionei. Embora possa muito bem ser uma generalização, trata-se, não obstante, de uma generalização que traz consigo a marca da verdade. Muitas outras pessoas inferiores cujas vidas receberam alegria e brilho de maneira similar foram capacitadas conseqüentemente a realizar uma certa obra na vida, artística ou secular, que, de outra forma, teria sido impossível.

Agora constitui um postulado mais ou menos lógico aquele que se conclui como uma direta conseqüência da premissa precedente, a saber: supondo que fosse possível através de uma espécie detentora de treinamento psicológico e espiritual induzir essa experiência ao interior da consciência de vários homens e mulheres dos dias de hoje, a humanidade como um todo poderia ser elevada além das aspirações mais sublimes, e surgiria uma poderosa nova raça de super-homens.

Na realidade, é para essa meta que a evolução tende e o que é encarado por todos os reinos da natureza. Desde os primórdios, quando o homem inteligente surgiu pela primeira vez no palco da evolução, devem ter existido métodos técnicos de realização espiritual por meio dos quais a verdadeira natureza humana poderia ser averiguada, e por meio dos quais, ademais, o gênio da mais alta ordem desenvolveu-se. Este último, poderia acrescentar, foi concebido como sendo apenas o subproduto e a eflorescência terrestre da descoberta da órbita do Eu estrelado, e em tempo algum, pelas autoridades desta Grande Obra, foi em si considerado um objeto digno de aspiração.

O “Conhece-te a ti mesmo” foi a suprema injunção impulsionando o elevado esforço deles. Se a criatividade do gênio se seguia como um resultado da descoberta do eu interior e da abertura das fontes da energia universal, se a inspiração das Musas resultava ou de um estímulo na direção de alguma arte ou filosofia ou da ocupação de leigo, tanto melhor. No começo do treinamento, todavia, esses místicos – pois foi com esse nome que essas autoridades passaram a ser conhecidas – eram completamente indiferentes a qualquer outro resultado além do espiritual. O conhecimento do eu e a descoberta do eu – a palavra “eu” sendo usada num sentido grandioso, noético e transcendental – eram os objetivos primordiais.

Se as artes têm sua origem na expressão da alma que escuta e vê onde para a mente exterior existem meramente silêncio e trevas, então evidentemente o misticismo é uma e talvez a maior das artes, a apoteose da expressão e do esforço artísticos. O misticismo, graças a algum suave decreto da natureza, tem sido sempre e em todos os tempos a mais sagradas das artes. O místico realmente abriga em seu peito aquela tranqüilidade que com freqüência se registra no rosto sereno do sacerdote exaltado ao altar. Ele é um reconhecido intermediário e porta-voz, as duas chaves sendo colocadas em suas mãos. Ele é, tanto as eras quanto seus colegas nas outras artes o admitem, mais diretamente introduzido ao interior do Santuário e mais imediatamente controlado pela psique. É por essa razão que seus sucessos são o sucesso de toda a humanidade em todos os tempos. Mas seus fracassos bastante freqüentes, quase como uma nova ruína de Lúcifer, são amargamente reprovados. Um mau poeta ou um mau músico é apenas alvo da censura daqueles de sua arte em particular, e seus nomes logo se apagam da memória de seu povo. Uma charlatão ou um falso mago, entretanto, põem em perigo o mundo inteiro, arrojando um pesado véu sobre a luz translúcida do espírito, a qual era sua principal tarefa trazer aos filhos dos homens. É por essa razão, também, que ele é em toda época somente para os muito poucos; mas, do mesmo modo, ele é para todos os poucos em todas as épocas.

Glorificado com as beatitudes de todos os artistas e profetas de todas as épocas, sofre ignominiosamente com o vilipêndio deles, pois eles, como ele próprio, são místicos. Ele é solitário. Afastou-se para o seio das solidões subjetivas. Para onde ele foi – aonde poucos podem segui-lo a não ser que também tenham as chaves – ele é elogiosamente aclamado com canções e ditirambos.

Não é um conhecimento teórico do eu que o místico busca, uma filosofia puramente intelectual sobre o universo – embora isso, inclusive, tenha seu lugar. O místico procura um nível mais profundo de compreensão. A despeito da retórica sobre a poder absoluto da razão, os lógicos e os filósofos de todos os tempos estavam intimamente convencidos da impropriedade e impotência fundamentais da faculdade do raciocínio. Dentro dela, acreditavam eles, existia um elemento de autocontradição que anulava seu uso na busca da realidade suprema. Como prova disso toda a história da filosofia se apresenta como eloqüente testemunho.
Acreditaram os místicos, e a experiência o confirmou reiteradamente, que apenas transcendendo a mente, ou com a mente esvaziada de qualquer conteúdo e tranqüilizada como uma lagoa de serenas águas azuis, um relance da Eternidade podia ser refletido. Uma vez acalmadas ou transcendidas as alterações do princípio pensante, uma vez subjugado o turbilhão contínuo que é uma característica normal da mente normal, substituídos por uma serena quietude, podia então, e agora somente, ocorrer aquela visão de espiritualidade, aquela experiência sublime das épocas, que ilumina todo o ser com o calor da inspiração e da profundidade, e uma profundidade de imagens do tipo mais elevado e que tudo abarca.

A técnica do misticismo se subdivide naturalmente em duas grandes classes. Uma é a magia, da qual nos ocuparemos neste tratado, e a outra é a ioga. E aqui é necessário registrar um veemente protesto contra os críticos que, em oposição ao misticismo – por cujo termo se compreende um tal processo como a ioga ou contemplação –, posicionam a magia como algo completamente à parte, não-espiritual, mundano e grosseiro. Julgo essa classificação contrária às implicações de ambos os sistemas e inteiramente incorreta, como tentarei mostrar daqui para a frente.

Ioga e magia, os métodos de reflexão e de exaltação, respectivamente, são ambos fases distintas compreendidas no único termo misticismo. Apesar de freqüentemente empregado de maneira indevida e errônea, o termo misticismo é utilizado ao longo de todo este livro porque é o termo correto para designar aquela relação mística ou estática do eu com o universo. Expressa a relação do indivíduo com uma consciência mais ampla ou no interior ou exterior de si mesmo quando, indo além de suas próprias necessidade pessoais, ele descobre sua predisposiçã a finalidades mais abrangentes e mais harmoniosas. Se essa definição estiver em consonância com nossos pontos de vista, então será óbvio que a magia, igualmente concebida para executar essa mesma necessária relação, porquanto mediante diferentes métodos, não pode satisfatoriamente ser colocada em oposição ao misticismo e às vantagens de um sistema laudatoriamente celebradas em oposição às impropriedades do outro, pois os melhores aspectos da magia constituem uma parte, tal como o melhor da ioga constitui também uma parte daquele sistema completo, o misticismo.
Tem-se escrito muito sobre ioga, de tolices e algo digno de nota. Mas todo o segredo do Caminho da União Real está contido no segundo aforismo dos Sutras de Ioga de Patanjali. A ioga busca atingir a realidade solapando as bases da consciência ordinária, de maneira que no mar tranqüilo da mente que sucede a cessação de todo pensamento, o eterno sol interior de esplendor espiritual possa brilhar para derramar raios de luz e vida, e imortalidade, intensificando todo o significado humano. Todas as práticas e exercícios nos sistemas de ioga são estágios científicos com o objetivo comum de suspender completamente todo pensamento sob vontade. A mente precisa estar inteiramente esvaziada sob vontade de seu conteúdo.

A magia, por outro lado, é um sistema mnemônico de psicologia no qual as minúcias cerimoniais quase intermináveis, as circumambulações, conjurações e sufumigações visam deliberadamente a exaltar a imaginação e a alma, com a plena transcendência do plano normal do pensamento. No primeiro caso, o machado espiritual é aplicado à raiz da árvore, e o esforço é feito conscientemente para minar toda a estrutura da consciência com o fito de revelar a alma abaixo. O método mágico, ao contrário, consiste no empenho de ascender completamente além do plano de existência de árvores, raízes e machados.

O resultado em ambos os casos – êxtase e um maravilhoso transbordamento de alegria, furiosamente arrebatador e incomparavelmente santo – é idêntico. Pode-se compreender facilmente então que o meio ideal de encontrar a pérola perfeita, a jóia sem preço, através da qual pode-se ver a cidade santa de Deus, é uma judiciosa combinação de ambas as técnicas. Em todos os casos, a magia se revela mais eficiente e poderosa quando combinada ao controle da mente, que é o objetivo a ser atingido na ioga. E, da mesma forma, os êxtases da ioga adquirem um certo matiz rosado de romantismo e significado inspiracional quando são associados à arte da magia.

Desnecessário dizer, portanto, que quando falo de magia aqui faço referência à teurgia divina louvada e reverenciada pela Antigüidade. É sobre uma busca espiritual e divina que escrevo; uma tarefa de autocriação e reintegração, a condução à vida humana de algo eterno e duradouro. A magia não é aquela prática popularmente concebida que é filha da alucinação gerada pela ignorância selvagem, e que serve de instrumento às luxúrias de uma humanidade depravada.
Devido a ignorante duplicidade dos charlatães e a reticência de seus próprios escribas e autoridades, a magia durante séculos foi indevidamente confundida com a feitiçaria e a demonolatria. Salvo algumas obras que foram ou demasiado especializadas em sua abordagem ou distintamente inadequadas para o público em geral, nada foi até agora publicado para estabelecer em definitivo o que a magia é realmente. Neste trabalho não se pretende tratar de maneira alguma de encantamentos de amor, filtros e poções, nem de amuletos que impeçam que a vaca do vizinho produza leite, ou que lhe roubem a esposa, ou da determinação da localização de ouro e tesouros ocultos. Tais práticas vis e estúpidas bem merecem ser designadas por aquela expressão tão abusivamente empregada, a saber, “magia negra”.

Este estudo não tem nada a ver com essas coisas, pelo que não se deve concluir que nego a realidade ou eficácia de tais métodos. Mas se qualquer homem estiver ansioso para descobrir a fonte de onde brota a chama da divindade, caso haja alguém que esteja desejoso de despertar em si mesmo uma consciência mais nobre e sublime do espírito, e em cujo coração arda o desejo de devotar sua vida ao serviço da espécie humana, que essa pessoa se volte zelosamente para a magia. Na técnica mágica talvez possa ser encontrado o meio para a realização dos mais grandiosos sonhos da alma.

Do ponto de vista acadêmico, a magia é definida como a “arte de empregar causas naturais para produzir efeitos surpreendentes”. Com essa definição – e também com a opinião de um escritor como Havelock Ellis, que é um nome dado a todo o fluxo da ação humana individual – estamos de pleno acordo, visto que todo ato concebível no período inteiro que dura a vida é um ato mágico. Que efeito sobrenatural poderia ser mais espantoso ou miraculoso do que um Cristo, um Platão ou um Shakespeare que foi o produto natural do casamento de dois camponeses? O que haveria de mais maravilhoso e surpreendente que o crescimento de um minúsculo bebê que atinge a completa maturidade de um ser humano? Todo e qualquer exercício da vontade – o erguer de um braço, o proferir de uma palavra, o germinar silente de um pensamento – todos são por definição atos mágicos. Entretanto, os efeitos “surpreendentes” que a magia procura abarcar ocupam um plano de ação um tanto diferente daqueles que foram indicados, embora estes, apesar de tão comuns, sejam, não obstante, surpreendentes e taumatúrgicos.

O resultado que o mago, acima de tudo, deseja concretizar é uma reconstrução espiritual de seu próprio universo consciente e secundariamente aquela de toda a humanidade, a maior de todas as transformações concebíveis. Mediante a técnica da magia, a alma voa, reta como uma flecha impelida por um arco tenso, rumo à serenidade, a um repouso profundo e impenetrável.
Mas é apenas o próprio homem quem pode esticar a corda do arco; ninguém além dele mesmo pode realizar essa tarefa para ele. É logicamente nesta cláusula de qualificação que o temporal fica à espreita. A “salvação” tem que ser auto-induzida e auto-inventada. As essências universais e os centros cósmicos estão sempre presentes, mas é o homem quem tem que dar o primeiro passo na sua direção e então, como disse Zoroastro nos Oráculos Caldeus, “os abençoados imortais chegam rapidamente”.

Quem causa e faz a sorte e o destino é o próprio homem. O curso de sua existência vindoura resulta necessariamente de seu modo de agir. E não apenas isso, pois na palma de sua mão reside a sorte de toda a espécie humana. Poucos indivíduos se sentirão aptos a despertar a coragem latente e a rígida determinação que comanda o universo, para que assim por uma estrada direta e isenta de obstáculos a espécie humana pudesse ser conduzida a um ideal mais nobre e a um modo de vida mais pleno e mais harmonioso. Houvessem tão-somente alguns homens se empenhando para descobrir o que realmente são, e apurando sem qualquer sofisma a refulgência cintilante de glória e sabedoria que arde no mais íntimo do coração, e descobrindo os vínculos que as ligam ao universo, e penso que não teriam apenas realizado seus propósitos individuais na vida e cumprido seus próprios destinos, como também o que é infinitamente mais importante, teriam cumprido o destino do universo considerado como um vasto organismo vivo de consciência.

O que significa acender uma vela? Nesse processo somente a porção mais superior da vela mantém a chama, mas, embora apenas a mecha esteja acesa, é hábito dizer que a própria vela está acesa, difundindo a luz que elimina as trevas à sua volta. Nisso podemos encontrar uma sugestiva referência que se aplica significativamente ao mundo em geral. Se apenas algumas pessoas em cada país, cada raça e cada povo pelo mundo afora encontrarem a si mesmas e entrarem em comunhão sagrada com a própria Fonte da Vida, graças à sua iluminação, elas se tornarão a mecha da humanidade e lançarão uma resplandecente e gloriosa auréola de ouro sobre o universo. Nesses indivíduos que constituem uma minoria minúscula, quase microscópica da população do globo, desejosa e ansiosa de se devotar a uma causa espiritual, reside a única esperança para a suprema redenção da espécie humana.
Éliphas Lévi, o celebrado mágico francês, arrisca uma opinião nova que acho pode ter alguma relação com esse problema e projeta um raio de luz sobre essa proposta. “Deus cria eternamente...”, escreve ele, “o grande Adão, o homem universal e perfeito, que contém num único espírito todos os espíritos e todas as almas. As inteligências vivem, portanto, duas vidas imediatamente, uma geral, que é comum a todas elas, e outra especial e individual”.

Esse Adão protoplástico é chamado nessa obra qabalística intitulada O livro dos esplendores, de Homem Celestial e compreende em um ser, como observa o erudito mago, as almas de todos os homens e criaturas, e forças dinâmicas que pulsam através de toda porção do espaço estelar. Não é meu desejo tratar de metafísica neste momento, discutindo se esse ser universal primordial é criado por Deus ou se simplesmente se desenvolveu do espaço infinito.

Tudo o que quero considerar agora é que a totalidade da vida no universo, vasta e difundida, é esse ser celestial, a Super-Alma como alguns outros filósofos o conheceram, criado para sempre nos céus. Nesse corpo cósmico nós, indivíduos, bestas e deuses, somos as minúsculas células e moléculas, cada uma com sua função independente a ser cumprida na constituição e no bem-estar sociais dessa Alma. Essa teoria filosófica admiravelmente sugere que como no homem da terra há uma inteligência que governa suas ações e seus pensamentos, da mesma maneira, em sentido figurado, há no Homem Celestial uma alma que é sua inteligência central e sua faculdade mais importante. “Tudo o que existe na superfície da Terra possui sua duplicata espiritual no alto, e não existe nada neste mundo que não esteja associado a algo e que não dependa desse algo.” Assim escrevem os doutores da Qabalah.

Tal como no homem a substância cerebral cinzenta é a mais sensível, nervosa e refinada do corpo, do mesmo modo os seres mais sensíveis, desenvolvidos e espiritualmente avançados no universo compreendem o coração, a alma e a inteligência do Homem Celestial. É nesse sentido, em suma, que os poucos que empreendem a realização da Grande Obra, isto é, encontrar a si mesmos de um ponto de vista espiritual e identificar sua consciência integral com as Essências Universais, como Jâmblico as chama, ou os deuses, que constituem o coração e a alma do Homem Celestial – esses poucos são os servos da espécie humana. Executam a obra da redenção e cumprem o destino da Terra.

O misticismo – magia e ioga – é o veículo, portanto, para uma nova vida universal, mais rica, mais grandiosa e mais plena de recursos do que jamais o foi, tão livre como a luz do sol, tão graciosa quanto o desabrochar de um botão de rosa. Ela é para ser tomada pelo homem.
(Israel Regardie)