21 de outubro de 2012

A ÁRVORE DA VIDA - Um Estudo Sobre Magia XII

Há uma série de correspondências que podem se revelar interessantes para o mago. Cada um dos deuses é caracterizado por alguma arma ou símbolo particular que expressa mais clara e perfeitamente do que qualquer outra coisa sua natureza essencial. Assim, quando o mago brande o bastão, deve-se conceber que ele assume para si a autoridade e sabedoria de Tahuti ante o conselho de deuses cósmicos. Com o cetro ele anuncia sua relação com Maat, a Senhora da Verdade e Soberania, enquanto o mangual ou açoite denota sua autoridade e auto-sacrifício associando-o de imediato a Osíris.

O bastão é a vontade, representando a sabedoria e a presença espiritual do eu criador, Chiah, devendo ser reto e poderoso, uma figura digna de sua força divina.

Passiva e receptiva, a taça ou cálice é um símbolo verdadeiro do Neschamah do mago, a intuição e compreensão que estão sempre abertas no aguardo do rocio superior que diariamente desce, de acordo com O livro do esplendor, das regiões mais elevadas para aquele de alma pura. No cerimonial, a taça é utilizada raramente, e nesse caso somente nas invocações mais elevadas para conter as libações. Nas evocações a taça não desempenha papel algum.

A espada é arma branca, dura e afiada, e perfurante como o ar que tudo permeia e penetra, sempre num estado de fluxo e movimento perpétuos. Por esse símbolo entende-se Ruach, ou a mente, a qual, quando sem treino é volátil e se acha num estado de contínuo movimento, sem estabilidade ou fácil concentração. Visto que se trata de um instrumento de corte, usado para análise e dissecação, o banimento da magia cerimonial é sua função primordial, não devendo jamais ser empregada em trabalhos que têm como clímax a invocação do mais elevado.

Arredondado, inerte e construído de cera, um símbolo adequado da terra, plástico e aguardando o cultivo pela inteligência, o pantáculo é um sinal do corpo, o templo do Espírito Santo, na iminência de receber mediante os ritos teúrgicos e telésticos o influxo do espírito divino. Um pantáculo, de acordo com Lévi, é um caractere sintético que resume o dogma mágico total em uma de suas fases especiais. É assim a expressão real de um pensamento completo e ato da vontade; é a assinatura de uma mente.

O triângulo da arte no qual o espírito evocado é conjurado à manifestação visível é, em si mesmo, um símbolo filosófico perfeito de manifestação. Representando as primeiras manifestações cósmicas ou as três Sephiroth maiores dos mundos superiores, o triângulo é a representação ideal da geração, da manifestação em existência coerente tangível daquilo que anteriormente era pensamento, invisível e metafísico. Tal como a primeira tríade representa a primeira manifestação completa do círculo de Ain Sof, do mesmo modo em magia o triângulo é responsável pela chamada à luz do dia dos poderes da escuridão e da noite. “

Há três que dão testemunho sobre a Terra”, e esses três são as pontas do triângulo, limitadas pelos três grandes nomes de Deus. Do círculo da consciência, que é o universo do mago, uma idéia partitiva e especial é convocada à manifestação no interior do triângulo.

O manto usado pelo teurgo representa sua glória interior ocultada. Como no budismo, o manto amarelo usado pelo bhikku simboliza o esplendor dourado de seu corpo solar interior, tornado glorioso por meio do despertar dos poderes superiores, o mesmo ocorrendo com o manto em relação ao mago. A cor deste manto variará dependendo do tipo de operação, vermelha para o trabalho marcial, azul para o trabalho jupiteriano e amarela ou dourada para operações solares. Os outros símbolos empregados em magia poderão agora ser facilmente desenvolvidos pelo leitor.

Com referência ao bastão, embora muitos magos, inclusive Abramelin, aconselhem que deva ser um instrumento razoavelmente longo, Éliphas Lévi observa que não deve exceder o comprimento do braço do operador e ser feito de madeira de amendoeira ou aveleira, uma única fiada do melhor arame de aço atravessando seu centro de extremidade a extremidade. Alguns magos colocam símbolos no ápice desse báculo. A cabeça da Íbis ocasionalmente empregada se refere a Tahuti, o Senhor da Sabedoria e patrono da magia.

Um dos melhores símbolos para um bastão é um forcado trino de ouro que representa a letra hebraica Shin, cuja significação é aquela do Espírito Santo dos deuses. Outro símbolo é o lótus, o qual, encimando o bastão, indica a regeneração e o renascimento que o mago busca realizar. Neste caso, o eixo é pintado de duas cores, a parte inferior de preto e a superior de branco. Bastante similar no que implica ao bastão do lótus é aquele coroado por uma fênix, o símbolo também da regeneração através do fogo.

Considerando-se que o bastão seja o símbolo da vontade criadora, sua construção deve ser acompanhada por um distintivo exercício dessa vontade, residindo nesta idéia a base racional de muitas das aparentemente absurdas e artificiais prescrições apresentadas pelos teurgos em conexão com a aquisição de convenientes armas mágicas.

De maneira superficial e à primeira vista, pode parecer que o distúrbio relacionado a esses instrumentos seja grosseiro exagero e por demais pueril. Mas se essa opinião for acatada, a idéia subjacente e essencial dessas instruções terá que ser descurada.

Se, por exemplo, as orientações de Lévi relativamente ao bastão tiverem que ser seguidas, então esse instrumento deveria ser confeccionado de um galho perfeitamente reto da amendoeira ou aveleira, galho este cortado da árvore sem entalhamento e sem hesitação de um só golpe com uma faca afiada antes do nascer do sol e na estação em que a árvore estiver prestes a florescer. O galho deverá ser submetido a um meticuloso procedimento de preparação, sendo despojado de suas folhas e brotos, a casca removida, as extremidades aparadas cuidadosamente e os nós aplainados. Seguem-se a isto vários outros procedimentos significativos que podem ser confirmados pela consulta de Dogma e Ritual de Alta Magia. O desenvolvimento da vontade está subjacente a todos esses procedimentos.

O mago que se incomodou a ponto de se levantar duas ou três vezes à meia-noite por seu bastão, negando-se repouso e sono, terá, pelo próprio fato de assim ter agido, se beneficiado consideravelmente no que diz respeito à vontade. Num tal exemplo, o bastão realmente será um símbolo dinâmico da vontade criadora, e são estes símbolos e instrumentos que são necessários em magia. “O camponês que cada manhã se levanta às duas ou três horas e caminha para longe de casa para colher um ramo da mesma planta antes do nascer do sol, pode realizar inúmeros prodígios simplesmente portando essa planta consigo, pois ela se tornará tudo que ele quer que ela seja no interesse dos desejos dele.”

Procedimentos similares aos mencionados acima no exemplo do bastão devem acompanhar a construção das outras armas elementares porquanto elas têm que ser a corporificação visível da própria condição de alma e mente do mago, sem o que não produzem efeito como símbolos taumatúrgicos. Se a mente do mago, por exemplo, não for perspicaz e analítica, e se essa qualidade não contribuir na confecção da espada, como os espíritos elementais e os demônios de face canina obedecerão a suas ordens para saírem do círculo de invocação?

O cálice, também, como o símbolo da intuição bem como da imaginação divina, deve, do mesmo modo, ser confeccionado de tal sorte e cercado de tais elevados pensamentos e proezas a ponto de corporificar alguma idéia intuicional, ou ostentando no seu exterior um desenho ou palavra de suprema significação, ou exemplificando pelo formato da taça tão-somente uma idéia divina. Compete a cada leitor decidir de que maneira os outros instrumentos portarão o selo da faculdade ou princípio espiritual que estão destinados a representar.

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Visto que ocorre frequentemente a alusão ao fato de que as duas faculdades principalmente empregadas na magia são a vontade e a imaginação, algumas páginas precisam ser devotadas ao exame dessas, apresentando-se os pareceres de teurgos juntamente com algumas sugestões úteis. Um dos mais elevados poderes de que dispomos, um poder tão maravilhosamente criativo que chega a ser indescritível e inexprimível, é a imaginação. É, postula Jâmblico, “superior à toda a natureza e a geração, através dele sendo nós capazes de nos unirmos aos deuses, de transcender a ordem mundana e de participar da vida eterna e da energia dos deuses supercelestiais.

Mediante esse princípio, portanto, somos capazes de liberar a nós mesmos do destino”. E, no entanto, a maioria das pessoas pensa que essa faculdade é idêntica à fantasia e ao devaneio, sendo que qualquer valor definido e consistente que possa possuir é negado. Dificilmente se poderia cometer erro maior. Como a própria palavra indica, trata-se de uma faculdade produtora de imagens, um poder criador de imagens que quando desenvolvido pode se mostrar de máxima importância como auxiliar da alma em sua jornada de avanço.

O filósofo cético Hume se refere a ela como uma espécie de faculdade mágica da alma que é sempre perfeita no gênio, sendo propriamente o que chamamos de gênio mesmo. Mesmo o metafísico Immanuel Kant, o inventor da pesada e às vezes rangente maquinaria intelectual a priori, acreditava que se pode falar do entendimento simplesmente como imaginação que atingiu uma consciência de suas próprias atividades.

A magia propõe um desenvolvimento acelerado da alma através de uma cultura intensiva na qual a imaginação desempenha um importante papel. É uma caricatura, portanto, e bastante lamentável considerarmos quão pouco é essa faculdade utilizada, e quão raramente a maioria das pessoas a faz atuar no desenrolar da vida cotidiana. E ainda assim, na realidade, sem ela e os aspectos variados de maravilha e novidade que concede a nossas atividades em todo campo de trabalho, a despeito de paralisada e tolhida pelos sentidos e a mente, nada duradouro e efetivo poderia ser feito.

Não apenas o poeta, o artista, o músico, o matemático e o inventor testemunham continuamente e cantam a sua grandeza, já que as realizações de todos eles se devem ao seu mistério permanente, como também o magnata dos negócios, o administrador e o chefe de Estado necessitam utilizar essa faculdade se quiserem que o sucesso cruze seus caminhos. Mais da metade do sabor rico e colorido da vida está perdida para o homem sem imaginação, enquanto que aqueles que são suficientemente felizes ou sábios para empregá-la muito ativamente colhem o mais agudo prazer possível ao ser humano.

O melhor exemplo de imaginação criativa é aquele que constantemente desfila eloqüentemente diante de nossos olhos: a brincadeira das crianças. Alguns pedaços de pau e cordão, algumas pedras, um pouco de lama e uma poça d’água suprem o garoto saudável normal de toda a matéria-prima a partir da qual ele construirá em sua própria mente uma inspiradíssima frota de couraçados e belonaves somada a um magnífico porto para eles. A boneca mais disforme é geralmente a favorita e a mais bonita para a garotinha, pois de algum modo o “patinho feio” parece proporcionar mais espaço para a imaginação da criança, enquanto que a boneca ricamente vestida de olhos móveis, cabelos louros e bochechas rosadas realmente destrói o gume penetrante da imaginação ativa e vívida.

Observando as crianças brincando percebe-se com quão poucas propriedades elas são capazes de construir todo um drama bem como uma tragédia comovente. E assim uma pessoa consegue ver poesia num repolho ou numa porca com seus filhotes, enquanto outra perceberá nas coisas mais excelsas apenas seu aspecto mais baixo e rirá da harmonia das esferas, e ridicularizará as mais sublimes concepções dos filósofos. A razão de um pintor ser capaz de ver num triste mendigo o tema para uma grande pintura é, de maneira semelhante, atribuível à mesma causa: o mistério da imaginação.

Como podemos explicar o mistério desse poder criador individual que, por assim dizer saltando sobre nós, se converte no mestre das imagens e das palavras? Assumindo o controle destas a partir da mente raciocinadora, concede-lhes significados simbólicos e mais profundos até que imagens, idéias e palavras se movem juntas e se reúnem, tornando-se um organismo por meio de algum poder formativo transcendental superior a toda razão. É tão misterioso realmente quanto o crescimento de um organismo na natureza, não menos maravilhoso que a planta que extrai da terra por meio de algum poder oculto as essências que transmuta e que torna subservientes a si mesma.
Nos séculos passados, na árdua investigação intelectual visando a determinar a raiz fundamental da existência, os filósofos se acostumaram a formular como lei que a existência se funda na razão e no pensamento, quer dizer, isso quando não eram monistas materialistas que afirmavam ser a matéria a única realidade.

Diversamente, o ponto de vista mágico, como formulado até aqui, é que nem a razão nem o pensamento jazem na raiz das coisas, pois o pensamento é simplesmente um aspecto do próprio cosmos. Trata-se sim de uma essência espiritual inominável que não é a mente mas a causa da mente, não o espírito mas a causa da existência do espírito, não a matéria mas a causa à qual a matéria deve o seu ser. Explicar o abismo intransponível entre a razão e o universo concreto constituiu um exercício severo para a mente filosófica.

A principal posição idealista era a de que tal como na lógica a conclusão segue rigorosamente os passos da premissa, do mesmo modo o universo é o produto lógico da razão absoluta e seu desenvolvimento segue a dedução de categorias racionais do pensamento. Recentemente, entretanto, um filósofo chamado Fawcett foi presenteado com um lampejo de supremo gênio no momento em que lhe ocorreu que o processo pelo qual o universo se desenvolveu e veio a ser foi um processo criador imaginativo e que a imaginação, não a razão absoluta ou mesmo uma vontade do instinto sempre impelida precipitadamente à manifestação, era a chave da solução desse desconcertante problema filosófico. Ele define essa imaginação como a matéria-prima na qual todas as faculdades e atividades humanas têm o seu ser.

Não desejo registrar aqui minha plena concordância com todas as conclusões de Fawcett, porquanto meus próprios pontos de vista são os da Cabala, expostos com certos detalhes alhures. Mas vale a pena observar que essa sua idéia parece em parte concordante com a dos teurgos. Eles postulavam a ideação como a primeira manifestação, que o universo veio a ser graças às atividades dessa ideação. Contudo, está claro que nenhum pensamento ou razão como o entendemos era sugerida, mas sim uma faculdade criadora mais abstrata ligada de algum modo à imaginação. A razão é para a imaginação o que a matéria é para a forma, o que o instrumento é para o agente, o que o corpo é para o espírito que governa, e o que a sombra é para sua substância reflexiva. É este poder residente no homem que Blavatsky chama de Kriyasakti, definido em A Doutrina Secretacomo “o poder misterioso do pensamento que o capacita a produzir resultados fenomênicos externos, perceptíveis por meio da própria energia que lhe é inerente”, e assim sendo parece que estaria também estreitamente vinculado à vontade.

Os rituais e as cerimônias agora considerados simplesmente uma perda de tempo por aqueles que desconhecem como conduzi-los e condenados como incapazes de produzir qualquer efeito real, detinham uma reação sumamente potente quando o simbolismo de cada ação da cerimônia era inteiramente reconhecido e compreendido e quando a imaginação era ampliada e a vontade firmemente concentrada no objetivo a ser realizado. Estando todo o ego humano num estado de excitação teúrgica, o Eu superior ou uma Essência universal descia sobre o ego ou o elevava, o qual se tornava assim um veículo luminoso de um poder supra-humano.

O que chamamos tão casualmente de imaginação no indivíduo comum é, de acordo com os teurgos de todos os tempos, a faculdade inerente à alma de assimilar as imagens e reflexos do astral divino, e Éliphas Lévi sugere que por ela mesma e com o auxílio de seu diáfano ou a imaginação, a alma pode perceber sem a mediação dos órgãos corporais os objetos, quer sejam eles espirituais ou físicos, que existem no universo. Em outras palavras, a imaginação é a visão da alma por meio da qual ela percebe direta e imediatamente idéias e pensamentos de toda espécie. E assim, inclusive, a clarividência é vista como uma extensão do poder da imaginação.

Admitindo, como o fazemos, a afirmação de Lévi de que a vontade e a imaginação são as faculdades criadoras aduzidas para sustentar as forças naturais durante as cerimônias teúrgicas, as seguintes perguntas podem ocorrer ao leitor: “O que fazer se as faculdades de alguém são apenas medianas? O que fazer se existe uma pobreza de criatividade espiritual? Se esses poderes não são particularmente potentes e capazes de formulação mágica, é possível que sejam desenvolvidos e fortalecidos?” A resposta é decididamente afirmativa pois indubitavelmente é possível desenvolvê-los e fortalecê-los.

Os sábios da Antigüidade conceberam vários exercícios cuja prática poderia transformar um indivíduo mais ou menos comum num indivíduo criativo e inspirado.
Aquele que está espiritualmente morto pode assim refazer-se e remodelar suas energias de maneira a passar a deter uma faculdade extremamente poderosa de criatividade e gênio. Ocupar-me-ei aqui de dois métodos, um predominante entre os hindus e o outro praticado por alguns cristãos, tendo eu delineado e explicado o método egípcio numa página posterior com um outro título.

Embora não advogando o catolicismo com seu jesuitismo luminar, devo mencionar a existência de um livro notável, indispensável e valioso para o aprendiz, da autoria de um místico jesuíta, Sto. Inácio de Loyola. Nesse pequeno volume é esboçado um sistema extraordinário de treinamento que se refere especialmente à imaginação; extraordinário, quero dizer, quando seguido por seu próprio mérito e divorciado de todo dogma e da teologia católica. É, está claro, cristão na sua intenção, com símbolos que apelam sectariamente aos católicos. Contudo, mediante um pouco de discernimento, o coração desse método pode facilmente ser separado do resíduo doutrinário dogmático.

Foi por meio desse método experimental que Sto. Inácio se tornou o homem de supremo gênio que foi, um homem que conquistou a reputação de ser, conforme o professor William James, um dos mais poderosos engenhos da organização e construção humanas já vistos sobre a face da Terra. Nesse livro que citamos, Os exercícios espirituais, aconselha seus discípulos a reviver na esfera da imaginação todos os eventos da vida histórica exterior de seu mestre, Jesus Cristo. Pelo método forçavam suas imaginações a ver, tocar, cheirar e provar aquelas coisas invisíveis e ensaiar aqueles incidentes há longo tempo acontecidos e desvanecidos, os quais eram percebidos através dos sentidos de seu Senhor encarnado. Sto. Inácio deseja que a imaginação seja exaltada até o seu pico.

Se você está meditando sobre um artigo de fé, ele o estimularia a construir a localidade claramente e com exatidão diante da visão do olho mental, e observá-la cuidadosa e rigorosamente, a ponto, por assim dizer, de tocá-la. Caso seja o inferno, ele daria a você pedras ardentes para serem manuseadas; ele faz você flutuar numa aterradora escuridão tão espessa quanto piche; ele deposita enxofre líquido sobre sua língua. Suas narinas ficam saturadas de um fedor abominável como o do próprio inferno e ele mostra a você tormentos terríveis, fazendo você escutar gemidos lancinantes. Ele faria você construir a visão do calvário com o Cristo glorificado coroado de espinhos sobre a cruz realizando a redenção da humanidade, inspecionando os céus com olhos doloridos, chamando ao mesmo tempo seu Pai no Céu. Ele faria você encarar o milagre formidável da ressurreição e os prodígios realizados há muito na Palestina – tudo isso Sto. Inácio manda que sua vontade crie em imaginação pelo exercício constante.

Alguns anos atrás, Franz Hartman escreveu a respeito desse mesmo assunto que “os exercícios prescritos por Loyola são calculados para desenvolver os poderes da alma, especialmente a imaginação e a vontade. O discípulo tem que concentrar sua mente nas narrativas da Bíblia do nascimento, sofrimento e morte de Jesus de Nazaré, como se esses fossem fatos históricos reais. O discípulo assim os considera, por assim dizer, como um espectador mental, mas gradualmente trabalhando sobre sua imaginação ele se torna, dir-se-ia, um participante; seus sentimentos e emoções são elevados a um estado de vibrações superiores; ele se torna ele mesmo o ator da peça, vivenciando ele próprio as alegrias e sofrimentos do Cristo, como se fosse o próprio Cristo; e essa identificação com o objeto de sua imaginação pode ser levada a um tal ponto que até mesmo estigmas ou ferimentos que sangram aparecerão em seu próprio corpo”.

Embora o teurgo não precise explorar tal prática a ponto de produzir os efeitos de que fala Hartman, é indiscutível de que se trata de um método infalível para estimular aquela faculdade criativa de que se é deficiente. Perseverança e contínua aplicação seguramente proporcionarão ao aprendiz uma vontade invencível, uma mente capaz de concentração prolongada e, acima de tudo, uma imaginação que constitui a apoteose da criatividade. Se o aprendiz não aprovar a importância religiosa que o santo atribui a esses exercícios – e se revelar uma profunda reprovação pelo dogma e teologia católicos – que use sua própria imaginação para construir seus próprios exercícios que sejam mais favoráveis e adequados ao seu temperamento individual. Que ele pinte para si mesmo a imagem de que está sentado junto a uma vigorosa queda d’água, uma Niágara, e diante de seu olho interior que ele crie uma imagem do rio lá em cima em sua nascente murmurando e perambulando no seu calmo curso.

Em seguida que ele conceba a gradual aproximação do precipício, torrentes selvagens de águas ensandecidas, redemoinhando para cá e para lá em cascatas agitadas de espuma esbranquiçada, colidindo contra as rochas, sendo irresistivelmente arremessadas adiante sobre o abismo. Que ele imagine também essas toneladas, milhares de toneladas de água, subindo e descendo impetuosamente sobre o precipício sob o contínuo eco reverberante do trovão. Conceba, então, o borrifo espalhando-se em todas as direções, a beleza da rebentação cor de neve refratando a luz do sol em arcos-íris iridescentes, repletos de cores e matizes brilhantes. E que ele ouça, e ao ouvir se maravilhe, a voz profunda e trovejante produzida pelo impacto formidando do volume das águas contra as rochas e águas mais abaixo.

O aprendiz pode ainda construir em sua imaginação mais coisas familiares: o ruído de um trem veloz, o sabor de chocolate em sua boca, os cheiros de suaves perfumes e fragrantes incensos penetrantes e o contato do carvão incandescente. Não só deve a formulação imaginativa do sentido ser distintiva, ou seja, o sabor de chocolate e não de caramelos doces por exemplo devendo ser claramente imaginado, como também o mago deve treinar-se de modo a suster a imagem ou impressão. Por meio desses estímulos da imaginação, seu poder germinará e crescerá, desenvolvendo-se de modo inconcebível, e com o passar do tempo o mago disporá de um novo poder de construção espiritual.

De maneira semelhante, os hindus prescrevem a meditação visando ao mesmo, tendo como objeto os Tattvas ou os símbolos coloridos dos elementos, dos quais eles sustentam cinco. As combinações desses cinco resultam em trinta elementos e subelementos, cujos símbolos pictóricos produzem objetos notavelmente bons para o exercício da imaginação. Dispõe-se de um triângulo equilátero vermelho, Tejas; um crescente prateado horizontal, Apas; um círculo azul, Vayu; Prithivi é um quadrado amarelo e Akasha uma forma oval negra.

As combinações de dois símbolos quaisquer, como um triângulo vermelho encimando um crescente prateado, ou um pequeno círculo azul colocado no centro de um quadrado amarelo parecem de uma maneira bastante singular se destacarem do fundo negro da visão interior e estimular todos os poderes da imaginação. Mas pouco tempo basta para adquirir eficiência na visualização desses símbolos, de sorte que quando o operador se aproxima das tarefas mais importantes da magia prática, tais como a formulação do corpo de luz ou Mayavi-rupa e a construção imaginativa das máscaras ou formas simbólicas dos deuses, descobrirá que em seu interior há uma força criativa poderosa que o servirá bem.

Todo esse treino, incluindo os exercícios de Sto. Inácio e os símbolos dos Tattvas,nunca é em vão e nunca se avizinha da futilidade, visto que tal treino proporciona o fundamento de todo trabalho teúrgico, sem o qual muito pouco de permanente e significativo pode ser concretizado.

Concordamos com as observações do mago francês no que dizem respeito à imaginação, que ela é a maior maga do universo. É a essa faculdade que devemos as criações imortais da poesia, da música e de todas as artes. A Canção e suas Fontes, um dos pouquíssimos trabalhos sensíveis de um poeta que lida com as origens de sua arte, confirma isso, e constitui uma prova salutar das teorias mágicas que concernem à imaginação. A. E. se aproxima bastante da filosofia teúrgica na medida em que supõe que em nossa natureza espiritual exista um ser transcendental que acorda quando dormimos e é conhecido vagamente nos estados dualistas do sonhar, quando a consciência parece dividida, e confere inspiração e luz através do mundo estelar da imaginação.

É o cristalino do eu criativo, sendo este aquele poder que opera milagres, curando os enfermos, trazendo socorro aos fracos e geralmente outorgando as revelações do espírito em benefício dos homens.

(Israel Regardie - Continua)

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